quinta-feira, 3 de abril de 2008

Do Blog de André Kfouri

http://www.lancenet.com.br/blogs_colunistas/akfouri/default.asp?arquivo=&PagAtual=2

Encontrei um amigo na quinta-feira passada, no Morumbi.

Trocamos mensagens de texto antes de São Paulo x Sertãozinho, jogo no qual estive por obrigação, e ele, por opção.

Eu o conheço há uns vinte anos, estudamos juntos.

Hoje em dia, nos vemos menos do que gostaríamos, é a vida. Por isso o encontro no estádio foi agradabilíssimo, desses momentos em que um jogo de futebol se transforma no pano de fundo para uma longa conversa sobre vários assuntos.

Este meu amigo é verdadeiramente apaixonado por esporte. Gosta de tudo, lê tudo, sabe tudo. Sua visão e suas idéias apontam para o caminho certo, aquele que o esporte brasileiro deveria estar trilhando.

Ficamos ali, imaginando como seria diferente se estivéssemos assistindo um jogo com vários craques em campo, válido por um campeonato bem organizado, num horário decente, com o estádio cheio de torcedores tratados como clientes.

E olha que estamos falando do Campeonato Paulista, do São Paulo, e do Morumbi.

Evidente utopia. Mas é engraçado como nem os problemas aparentemente insolúveis são capazes de nos roubar o otimismo, quando descobrimos um motivo para crer no futuro.

O motivo deste meu amigo é seu primeiro filho, razão pela qual ele escreve um blog.

O blog é o diário da vida do bebê, pontuado pelos jogos do São Paulo. O pai assiste um jogo do time, vai para o computador, e escreve para o filho contando como foi a partida, relacionando-a com os fantásticos avanços de uma criança em pleno desenvolvimento.

Um dia, o garoto lerá o diário, e nem perceberá que a paixão pelo futebol lhe foi transmitida de uma forma extraordinariamente linda.

Coisa séria, não?

Muito bem. É de se supor que o próximo passo será levar o pequeno torcedor ao estádio, apresentá-lo à incomparável experiência do futebol in loco, responder as centenas de perguntas, abraçá-lo na hora do gol.

Sim, este é um cenário imaginável.

O problema é que há outro, também imaginável, por mais desgraçado que seja.

Aconteceu com um pai que não conheço, e com seu filho pequeno, no Maracanã.

O relato chegou por e-mail, que publico abaixo, obviamente suprimindo nomes e um número:

"Este é o relato do que aconteceu comigo, (...), e com meu filho no dia 29 de março, no jogo entre Flamengo e Madureira, no Maracanã.

Estávamos subindo a rampa que leva à entrada das cadeiras azuis, onde meu filho (...), menor de 12 anos, entra gratuitamente, quando fomos
abordados por dois garotos que pediram para entrar comigo, se passando por meus filhos.

Eu disse não a eles três vezes, eles insistiram e bloquearam a passagem na roleta destinada aos menores de idade. Eu passei por outra roleta e fiquei esperando o meu filho passar, mas os garotos continuavam bloqueando a passagem e o (...), ao me ver do lado de dentro, ingenuamente, passou por baixo de outra roleta, sendo prontamente empurrado pela cabeça por um funcionário despreparado da SUDERJ. Ao mesmo tempo, os garotos que se diziam meus filhos entravam no estádio e corriam para assistir a partida.

Indignado e enfurecido com a situação, comecei a gritar, exigindo que meu filho entrasse, o que gerou uma ríspida discussão entre mim e o
funcionário que o havia empurrado.

Imediatamente fui cercado por quatro outros funcionários do quadro móvel da SUDERJ, e um deles, que vestia o colete (...), desferiu um tapa violento no meu rosto. Mais indignado e enfurecido, saí pelas roletas e fui procurar policiais que me disseram que não poderiam fazer nada, eu teria que ir ao juizado especial que funciona no estádio.

Mas o juizado não estava funcionando.

Eu tinha duas opcões: ir à décima oitava-delegacia
policial ou esperar até o dia seguinte, quando se realizaria o clássico Fluminense x Botafogo, para fazer a minha queixa no juizado especial do Maracanã.

Vendo meu filho chorar e tendo certeza que ele
nunca mais vai querer ir a um jogo de futebol, resolvi voltar para casa.

Mas ainda tive que ouvir de pessoas que trabalham no Maracanã, que o meu agressor é policial civil e por isso não deveria insistir na
queixa, e que as imagens da agressão, gravadas por câmeras espalhadas pelo estádio, seriam apagadas."

E então? Até onde vai nosso otimismo?

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