quarta-feira, 6 de junho de 2007

O PAN e seus legados

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Maria Luiza Testa Tambellini, Publicado em 18/5/2007.

O Comitê Social do PAN foi criado em abril de 2005 com a preocupação de unir segmentos organizados da sociedade. A idéia era saber em que cidade vivemos durante os preparativos para os jogos Pan-americanos e, sobretudo, que cidade herdaremos após a realização dos mesmos. Nossas atenções estão voltadas basicamente às intervenções urbanísticas e seus impactos sociais e ambientais; aos processos orçamentários; aos canais de participação da sociedade civil; e à Agenda Social do PAN.
[...]

Ações e reflexões

A primeira realização foi o seminário “Que PAN nós queremos. […]
A perspectiva crítica que se visualizou quanto à construção e ao uso dos equipamentos, em relação à sua fruição, pode ser percebida em Lopes:

Deve-se considerar também que os efeitos provenientes das obras de melhoria de infra-estrutura urbana e das novas instalações construídas ou reformadas para os Jogos devem beneficiar a população como um todo, caso estas sejam financiadas com recursos públicos, e que possam ser utilizadas para o proveito da sociedade. (Lopes, 2005).

Essas reflexões se ampliam com as considerações elaboradas pelo grupo de trabalho da Universidade Federal Fluminense que aponta para o seguinte:

Percebe-se claramente, que está em curso uma opção urbanística que privilegia a apropriação dessa área pelos interesses de mercado, o que se traduz muito mais num processo de modernização/reestruturação (seletiva e excludente) do que propriamente de desenvolvimento urbano mais inclusivo.(GPDU/ UFF, 2005)

Invoca-se aqui as propostas constitucionais sobre a gestão das cidades, em especial no que se refere às possibilidades de participação, transparência e escolha do seu destino. Em texto de minha autoria e de Murad:

Nessa linha de raciocínio, o Direito à Cidade deve ser compreendido como um direito coletivo, por meio da participação popular e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de grandes eventos na cidade, ou qualquer obra que venha a provocar algum tipo de impacto para a população ou parte dela. É por isso que a população tem de ser consultada sempre. No entanto, o organismo municipal que deveria estar assumindo o compromisso, fortalecendo a sociedade como protagonista dessa discussão, está assumindo, como já vimos antes, a posição contrária, aquela do decidir e depois informar à população. O Pan não poderia ser então, neste sentido o começo de uma nova era? (Tambellini e Murad)

Tudo indica que essa nova era não integra as relações propostas pelos executivos do PAN. Segundo Melo:

(...) a sociedade civil deve se organizar para cobrar transparência importante na execução orçamentária e fiscalizar os reais benefícios que tal evento pode trazer ao nosso município. O momento de festa, por certo, será maravilhoso (esperamos!), mas não podemos esquecer que tem um custo (financeiro e social).
As últimas informações sobre os Jogos Panamericanos do Rio de Janeiro são motivo de preocupação. O projeto original foi bastante modificado, alguns ganhos inicialmente apregoados já foram abandonados (como o caso da linha de metrô), o orçamento cresceu significativamente, comunidades localizadas ao redor da realização das competições têm sido fortemente atingidas e ainda grassa muita desinformação acerca dos números que envolvem os Jogos.
(...) e como cidadãos cobrarmos a resposta às perguntas: quem paga essa conta? Quem ganha concretamente com isso? (Melo, 2005)

A preocupação com a gestão existente na cidade, agora em situação de exposição a ações radicalizadas pelo mega-evento esportivo, propõe novas reflexões e ações necessárias, pelo menos com os compromissos assumidos em relação ao legado pós-PAN. Segundo Esteves:
(...) Teremos, provavelmente o legado negativo e assim, comprometeremos uma parte da nossa receita e dos impostos que pagamos por um horizonte de tempo que deverá girar em torno dos 10 anos. Já o legado positivo, no aspecto circulação, mobilidade e transporte será frustrantemente nenhum. As soluções apresentadas são essencialmente rodoviaristas e configuram um cenário onde a Cidade e suas necessidades parecem representar um transtorno para a realização do Pan. [...] (Esteves,2005)
[...]

Segundo Melo:
Felizmente, a estrutura social não é passiva. A cidade é um espaço de luta. Embates e discussões são travados, no espaço urbano, por seus atores sociais. São os cidadãos que participam desses embates e discussões que vão ajudar a decidir o futuro da cidade. (Melo,2005).

Assim sendo, as contradições se consolidaram, fazendo com que a sociedade se mobilizasse e conseguisse instalar um cenário de discussões e ações que propiciaram outros legados:

a proposição dos Jogos Pan-americanos para todos(as), com transparência, participação, justiça social e esportes;

a afirmação de que toda construção ou obra feita com recursos públicos em nome do PAN tenha gestão e uso público, para evitar a privatização desses espaços após o PAN;

que o planejamento da cidade pode e deve ser feito por todos(as) os(as) moradores(as), incluindo as decisões sobre os grandes eventos como o PAN, entre outros que porventura possam acontecer;

que a organização das lutas por moradia digna e regularização fundiária são ainda necessárias para evitar processos perversos de remoções;

as vitórias obtidas em lutas com a participação de vários segmentos da sociedade civil contra os projetos que desrespeitam as leis, uma vez que propõem ocupar espaços públicos de preservação ambiental e/ou de patrimônio, transformando-os em áreas de controle privado;

a inclusão das possibilidades de trabalho conjunto com o Ministério Público Federal e Estadual trouxe uma experiência importante e ampliou as reflexões sobre as responsabilidades de todos(as) no cuidado dos interesses difusos e coletivos da sociedade.

Essas primeiras reflexões calcadas na cidadania ativa são apenas um estímulo para que o processo se inicie. O acúmulo do movimento será importante para enfrentar novas realizações anunciadas pelos “aproveitadores de plantão”, como outros grandes eventos, tais como a Copa do Mundo e as Olimpíadas.
Já existem algumas propostas de trabalhar nesse sentido nas organizações da sociedade civil, no ambiente universitário, em grupos de pesquisadores(as) sobre esportes, jornalistas, urbanistas, parlamentares, economistas e ONGs. As agendas de trabalho voltadas para esses grandes eventos já estão adiantadas. Cabe que a agenda da cidadania, que pressupõe práticas democráticas, imediatamente se faça e aja, para a realização de projeto de CIDADE PARA TODOS.

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