Diana: O interessante é notar que, mesmo os que consideraram o evento um sucesso, o fazem com tantas ressalvas que terminam por comprovar as observações feitas neste blog ao longo de quase três anos:
Jornal do Brasil
28/07/07
Editorial:
Para não perder o bonde do Pan
A sucessão de desvios administrativos, políticos e morais que culminou na crise aérea sem fim contrasta com o apuro gerencial do Pan-Americano. Apesar do atraso nas obras e da conseqüente dispensa de licitações, alvo de investigação dos Tribunais de Conta, os Jogos chegam ao fim como exemplo de organização.
Vencem a desconfiança quanto à competência para acolher uma competição de grande porte. Credenciam o Brasil ao sonho olímpico.
Os erros no planejamento e na execução dos gastos precisam ser apurados e corrigidos para consolidar a passagem ao estágio dos países capazes de organizar Copa do Mundo, Olimpíada. É igualmente essencial aperfeiçoar os acertos, mantê-los imunes a oportunismos e manipulações eleitorais.Somado ao salto esportivo - expresso no recorde de medalhas e na popularização da ginástica artística - o êxito administrativo terá, em princípio, de afastar a soberba. Há muito a evoluir.
A venda de ingressos, por exemplo, repetiu uma incompetência crônica, observada em deslizes como a oferta de bilhetes com preços diferentes para lugares iguais no Campeonato Carioca. Este serviço básico segue vulnerável à ação de cambistas - nas barbas da polícia - e aos lapsos de controle. A falta de rigor abre brechas para o inacreditável: estádios com lugares vazios em partidas com ingressos esgotados.Embora o Pan represente um passo largo rumo à elite esportiva, a ambição exige muito mais do que a inexistência de falhas graves e o brilho de espetáculos inesquecíveis, do Hino Nacional cantado à capela por Elza Soares ao coro de 60 mil torcedores na festa do futebol feminino no Maracanã. A transição para o primeiro mundo envolve uma complexidade de ações, coordenadas por parcerias entre o poder público e a iniciativa privada. Integração ainda distante do pódio.
Um dos desafios primordiais é ampliar os benefícios legados. Em três níveis: esporte de alta performance, comunitário e educacional. Para reforçar a ascensão brasileira, são necessários o aproveitamento inteligente dos núcleos do Pan e a gestação amplificada de talentos, hoje restrita aos clubes e a esforços individuais.
O velódromo e os complexos Maria Lenk, do Riocentro e de Deodoro precisam espantar o fantasma de ociosidade com uma programação permanente de disputas nacionais e internacionais. Só assim corresponderão aos milhões investidos, convertendo-se em fontes de lucro, craques e audiência.
Outros caminhos importantes à consolidação do Brasil como potência esportiva remetem ao aumento das células embrionárias de atletas -- clubes, escolas, comunidades - e ao aprimoramento das condições de treino, o que envolve desde instalações e equipamentos de excelência até intercâmbios. Tal progresso depende de uma política unificada para o esporte, acima de interesses particulares, sem a qual boa parte dos ouros festejados torna-se efêmera. Pois resulta de vitórias pessoais contra a falta de estrutura.
Cumpre aos governos, empresários, confederações, comitês aprofundar o planejamento pan-americano. A começar pela divisão de tarefas. Cabe ao poder público irrigar os projetos esportivos voltados para o lazer, a saúde, a formação individual, a educação, a cidadania e a inclusão social. Resistir à tentação de apropriar-se dos pódios, confundi-los com palanques. Compete à iniciativa privada o suporte para transformar talentos em conquistas e conquistas em dinheiro e prestígio.
Ou o Brasil perderá o bonde do Pan.
Folha de São Paulo
28/07/07
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Brasil tem condições de sediar uma Olimpíada?
SIM
Sim, mas aprendendo com o Pan
WALTER DE MATTOS JUNIOR
POR TODAS as nossas potencialidades, o Brasil reúne condições para realizar os Jogos Olímpicos. O Pan do Rio foi além do esperado, mas aquém do possível e do desejável.
Às vésperas do evento, poucos acreditavam no término das obras e que o Pan transcorresse num nível mínimo de qualidade. Pior, a maioria temia um vexame. Felizmente, a dois dias do final, graças à competência esportiva de consultores e da equipe do Co-Rio, o pessimismo não se materializou.
É verdade que o clima dos Jogos não permeou a cidade e que nem tudo foi perfeito, mas a avaliação geral é bastante positiva. A boa imprensa cumpriu seu papel, aplicou olhar crítico antes, durante e o fará depois dos Jogos, apontando falhas e eventuais irregularidades que podem ser investigadas.
Portanto, não é o caso de usar este nobre espaço para detalhar erros, normais e perfeitamente corrigíveis num próximo evento. Vamos nos preocupar com o que não foi feito, com o custo da oportunidade perdida.Mesmo países muito ricos não podem se dar ao luxo de realizar um evento esportivo como fim. Eles devem ser um veículo para inspirar e tornar real um sonho grandioso e transformador. Quando a chance existe, não pode ser desperdiçada.
Assim foi Tóquio (64), que apresentou ao mundo a modernidade do pós-Guerra, Barcelona (92) e a recuperação do pós-franquismo. O mesmo ocorreu em Seul (88) e Sydney (04), pontas-de-lança da inserção global de seus países. Os Jogos foram veículo de realização da vontade coletiva, latente, que seus líderes souberam ler, canalizar, datar e alavancar por meio desse que é o evento de maior alcance da humanidade. Esse não foi o caso do Pan do Rio.
Mas é obrigatório que seja o dos Jogos Olímpicos para o Brasil.
O projeto do Rio em 2002 continha obras transformadoras, como o Transpan, a despoluição das lagoas da Barra, a linha 4 do metrô e a duplicação da estrada lagoa-Barra. Além disso, prometeu o alcaide Maia (nesta semana prometeu de novo) investir na formação de atletas. Lamentavelmente nada disso saiu do papel. Escalamos, sim, novos patamares esportivos, fruto de investimentos oriundos das loterias, mas não houve efetiva alteração da realidade. Precisamos converter o custo deste Pan em aprendizado. E isso se traduz em termos um sonho de transformação e uma forma de realizá-lo.Os eixos inspiradores do projeto dos Jogos Olímpicos devem ser o investimento maciço em educação e esporte para a juventude de todo o país e a revitalização do Rio.
Unir esporte e educação é a saída mais promissora para valorizar a escola como o caminho para a esperança e a conquista do futuro e, ao mesmo tempo, economizar em saúde e segurança pública. A outra frente seria igualmente virtuosa para o Brasil: uma mudança na trajetória de declínio econômico e social do Rio é indispensável para um país que ambiciona ser potência global e relevante pólo de turismo.
Não há projeto mais oportuno para aglutinar idéias e pessoas competentes em torno de um plano consistente para a cidade síntese do país (afastada de sua função de capital e depois forçada à fusão pelos militares) e para nossos jovens.
A recuperação do Rio e o investimento de qualidade na juventude do Brasil concretizará o propósito maior dos Jogos Olímpicos. Não obstante, mesmo havendo um projeto inspirador e conseqüente, há que se chegar a um modelo indutor e que tenha controle social.Para se realizarem Olimpíadas, os investimentos são de enorme expressão. Isso, por definição, subtrai recursos de outras prioridades nacionais. Então é desaconselhável que todo esse processo seja conduzido de maneira hermética e por um pequeno grupo (no caso do Pan, foi o COB e o prefeito Cesar Maia, até o "socorro" da União), sem uma ativa governança que contenha representação da sociedade.
Ao COB cabe a liderança absoluta em tudo o que for do campo esportivo. Aos governos, aplicar a boa prática da gestão do público.A hora para praticar um novo arranjo institucional é a da candidatura, definindo os investimentos, a maximização da participação privada e aplicando o conceito de transparência absoluta. Assim, a resposta para a pergunta é um SIM convicto. A oportunidade é extraordinária e não deve ser perdida.
WALTER DE MATTOS JUNIOR, 45, fundou e é editor do diário "Lance!".
Diana: Sinceramente, fico com a frase " Os investimentos (para os Jogos Olímpicos) subtraem recursos de outras prioridades nacionais". Dado sermos um país com tantas prioridades, não vejo, siceramente, nada que justifique tirar recursos de saúde, educação, saneamento, infraestrutura (como aconteceu com o PAN, conforme documentado pelo Senado e publicado aqui); para investir em um evento que, na prática, excetuando os resultados esportivos, nada de trouxe de útil para a melhoria do cotidiano do brasileiro em geral, muito menos do carioca em particular. E nenhum dos argumentos acima consegue convencer-me de que com Jogos Olímpicos seria diferente. Ao contrário, a outra observação do texto acima ( "a condução do processo por um pequeno grupo") seria ainda mais patente.
sábado, 28 de julho de 2007
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