segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Dinheiro público dita projetos da Copa

Folha de São Paulo, São Paulo, domingo, 26 de agosto de 2007

Dinheiro público dita projetos da Copa

Entre as 18 candidatas a abrigar jogos do Mundial no Brasil, 11 cidades admitem verbas do Estado em praças esportivas Planos exibidos a inspetores da Fifa no país contrariam discurso da CBF, que fizera promessa de que estádios só usariam recursos privados

RODRIGO MATTOSDA REPORTAGEM LOCAL RICARDO PERRONE DO PAINEL FC

No Brasil desde quinta-feira, os inspetores da Fifa encontram-se com governantes dispostos a derramar dinheiro público em estádios para a Copa de 2014. Os projetos vão na contramão da posição de Ricardo Teixeira, que prometia só recursos privados nas arenas.
Levantamento da Folha com 16 das 18 candidatas a receber jogos do evento mostra que pelo menos 11 projetos prevêem dinheiro dos Estados ou cogitam a possibilidade de usá-lo.Entre as cidades que pretendem obter dinheiro com empresas, nenhuma tem acordo fechado com interessados em construir as praças esportivas.
As 11 cidades que fizeram um levantamento dos gastos estimam que seus estádios custarão um total de R$ 2,2 bilhões.Questionada pela Folha, a CBF não se pronunciou -Teixeira não foi localizado.
Cartola da Fifa disse aos brasileiros que a entidade não dará diretamente verba para os Estados usarem nas arenas. Fará repasses ao comitê organizador, que decidirá o que fazer.
A Fifa deve enviar US$ 1 bilhão. O São Paulo é um dos que contam com o dinheiro dela.
Na Copa da Alemanha, estádios foram bancados por clubes, firmas e órgãos públicos.
Desde sexta, os inspetores da Fifa ouvem representantes das 18 candidatas. E visitarão cinco delas: Rio de Janeiro, Brasília, São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte, a partir de amanhã -a entidade dirá em outubro se o Brasil, candidato único ao Mundial, é capaz de abrigá-lo.
A reforma de praças implica dinheiro público porque a maioria pertence aos Estados.
"A obra será totalmente financiada pelo governo do Estado", contou a secretária de Esporte do Pará, Maria Lúcia de Penedo, sobre o Mangueirão.
MT, MS, BA, GO, PE, AC, SC e RN pensam em dividir as despesas com empresas.Em Recife, o custo do novo estádio está estimado em R$ 250 milhões. O Estado pagará a desapropriação do terreno escolhido. "Será uma parceria público-privada", afirmou o secretário de Esporte de Pernambuco, Nelson Pereira.
A fórmula é repetida por outros governos. Em Mato Grosso, a idéia é botar abaixo o estádio Verdão, só ficando o gramado. "A princípio, o governo fará uma concessão. Mas existe a possibilidade de dinheiro público, caso não haja investidores", contou o secretário de Esporte do Estado, José Joaquim.
Há Estados, como Minas Gerais, que buscam dinheiro privado, mas podem gastar. O Mineirão deve sofrer a reforma mais cara: R$ 398 milhões.
"O projeto é obter parceria, com concessão e direito de uso, sem contrapartida do Estado. Minas Gerais não tem como arcar com os valores", diz o secretário de Esporte de MG, Gustavo Corrêa. "Mas nada impede que o governador decida investir determinados valores.
"É o mesmo caso do Ceará, com a reforma do Castelão estimada em R$ 40 milhões.
Cinco cidades só falam em buscar investidores privados, casos de Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Brasília. Mas ainda não sabem de onde virá o dinheiro.
Os paulistas admitem doar o terreno para uma nova arena, se o Morumbi for vetado.
Cartola são-paulino diz que, se não vier verba da Fifa, recorrerá a governantes, pois tem de honrar termo de compromisso. "Se nos procurarem, faremos engenharia financeira enviando verba privada ao Morumbi", diz Walter Feldman, secretário municipal de Esporte.

Até hotéis flutuantes se tornam opção

DO PAINEL FCDA REPORTAGEM LOCAL

Item mais pesado nos orçamentos das Copas, a infra-estrutura tem custo minimizado por boa parte dos Estados candidatos a 2014. A maioria dos governos promete gastar só o que já desembolsaria em projetos independentes do Mundial.
Para provar que as cidades são capazes de receber grandes eventos, eles citam os que costumam organizar. Alguns da lista: Círio de Nazaré (Belém), Carnaval (Salvador) e a Parada Gay, lembrada no relatório enviado pelos paulistas à Fifa.
E, para atender a algumas das exigências da Fifa, lançam mão de idéias como hotéis flutuantes, no mar ou em rios.
No Mundial da Alemanha, ano passado, a maior parte dos custos foi em transporte, segurança e hotelaria. No total, foram desembolsados entre R$ 22 milhões e R$ 27 milhões em infra-estrutura. A construção e a reforma de estádios consumiram R$ 5,6 bilhões.O país europeu conta com uma rede ferroviária e rodoviárias de maior qualidade, menor índice de criminalidade e maior número de quartos de hotéis em relação ao Brasil.
Aqui, quase todas as cidades dizem ter quartos suficientes para receber estrangeiros. Acenam com novas avenidas e, em meio ao caos aéreo, aeroportos em expansão para assegurar um transporte eficiente.
"[Brasília] está preparada para o evento em termos de segurança, transporte, hotelaria. O metrô já liga as cidades-satélites e está em expansão", diz o secretário de Esporte do Distrito Federal, Aguinaldo Jesus.
Porto Alegre, praticamente pronta segundo a prefeitura, não promete implantar metrô subterrâneo para a Copa. "Diremos à Fifa que as pessoas vão aos jogos de ônibus ou táxi", fala João Bosco Vaz, secretário de Esportes da capital gaúcha.
A prefeitura e o governo paulista dizem que todos os gastos ocorreriam mesmo sem a Copa. Como na linha do metrô que irá até o Morumbi. A estação vizinha ao estádio, porém, não terá o trem sobre uma ponte idealizado pelos são-paulinos, que contavam com verba pública. Em compensação, o projeto ganhou hotéis flutuantes: navios ancorados em Santos."Vamos mostrar à Fifa que ofereceremos transporte de massa de qualidade aos torcedores. Além de excelência em cultura, hotelaria e culinária", afirma o secretário municipal de Esporte, Walter Feldman.
Tradicionais Estados turísticos, Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco acenam com sua rede hoteleira em expansão e com pontos geograficamente mais próximos da Europa.
"Já temos dois resorts em construção. Mas podemos receber hotéis flutuantes por sermos litorâneos", relata o secretário de Esporte do Ceará, Ferrúcio Feitosa, que diz ter verbas para um metrô até 2010. Como solução para a segurança, destaca um projeto chamado "ronda do quarteirão".
Também no Pará, a Secretaria de Esporte diz que o rio pode ser usado para receber turistas. Investimentos de R$ 900 milhões prometidos no Programa de Aceleração ao Crescimento (PAC) são outra aposta.
Quase todas as cidades acenam com expansões de aeroporto, todas com promessas da Infraero e com projetos aprovados. "Temos aprovado um modelo para aumento da área de desembarque e embarque igual ao de Brasília", revela o secretário de Esporte de Mato Grosso, José Joaquim de Souza Filho, em um dos exemplo.
O Estado é o único que fez uma estimativa de seus gastos em infra-estrutura: R$ 650 milhões. Seriam divididos em dinheiro público e privado, por exemplo, para hotelaria.
Em Campo Grande, o secretário de Esporte, José Rocha, diz que, na segurança, tem "profissionais que trabalharam na viagem do papa, no Pan e no Parapan". E fala em equipamentos herdados do Pan.
Os Jogos servem de inspiração para Goiás traçar faixas seletivas de transporte entre hotéis e aeroportos. Sem ser destino turístico, a cidade conta com hotéis de Caldas Novas, estação de águas quentes. "Teremos sistema de segurança com helicóptero e Exército", disse o presidente da Agência de Esporte do Estado, César Febá.
(RICARDO PERRONE E RODRIGO MATTOS)

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