terça-feira, 27 de novembro de 2007

Procurador promete processar os responsáveis pelo acidente

Ministério Público alerta para os riscos do estádio desde 2005

Alan Rodrigues
http://www.correiodabahia.com.br/aquisalvador/noticia.asp?codigo=142302

Omissão. Esta teria sido a causa da tragédia que provocou a morte de sete pessoas domingo na Fonte Nova, quando parte da arquibancada superior cedeu. A conclusão é do Ministério Público Estadual (MPE), que desde 2005 vinha alertando os responsáveis pelo estádio dos riscos oferecidos pela estrutura. Tanto o poder Executivo, que não adotou as providências cabíveis, como o Judiciário, que até hoje não se manifestou sobre o pedido de interdição encaminhado em janeiro de 2006, teriam contribuído para as mortes.
A promotora Joseane Suzart interrompeu uma licença médica para falar sobre o caso. Ela mostrou o laudo concluído em janeiro de 2006, que motivou duas ações civis públicas, contra o Vitória, relativa ao Estádio do Barradão, e contra a Superintendência de Desportos do Estado da Bahia (Sudesb) e Esporte Clube Bahia, gestor e mandante dos jogos na Fonte Nova.
Apenas no caso do Vitória, apreciado pela 1ª Vara de Defesa do Consumidor, a liminar foi expedida e motivou a assinatura de um termo de ajustamento de conduta (TAC). A ação relativa à Fonte Nova, impetrada na 2ª Vara do Consumidor, não obteve apreciação em um ano e dez meses de seguidas petições, segundo a promotora.
Na vistoria realizada pelo Corpo de Bombeiros, documentada com fotos, o MPE constatou ferragens expostas, tubulações enferrujadas e piso irregular e sem revestimento, além de várias infiltrações.
Desmentido - Segundo Bobô, superintendente da Sudesb empossado em janeiro deste ano, na sua gestão jamais houve qualquer notificação sobre os riscos da estrutura do anel superior da Fonte Nova. Informação desmentida pela promotora. “Tivemos uma audiência em março com a presença de dois diretores da Sudesb”, afirma Suzart, acusando o poder público de “negligência”.
O procurador geral de justiça Lidivaldo Brito disse que o MPE vai aguardar apenas a conclusão do inquérito policial para responsabilizar criminalmente os culpados pela tragédia. Ele lamentou que tanto tempo após a denúncia do MPE não tenha havido um posicionamento judicial.
O promotor Nivaldo Aquino, assessor especial criminal e responsável pelo grupo de combate à violência nos estádios, foi designado para acompanhar o caso. Após a apuração das responsabilidades, ele pretende enquadrar os gestores envolvidos na acusação de homicídio culposo, quando há “negligência, imprudência ou imperícia”. A pena para este crime é de um a três anos de prisão.
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Homicídio doloso
Os gestores da Superintendência dos Desportos do Estado da Bahia (Sudesb), da Federação Baiana de Futebol (FBF) e do Esporte Clube Bahia poderão responder por homicídio doloso (com intenção de matar) pelo acidente em que sete pessoas morreram quando a arquibancada situada no anel superior da Fonte Nova desabou durante a partida entre o Bahia e o Vila Nova, válida pela penúltima rodada da Série C do Campeonato Brasileiro, realizada no domingo.
O delegado Carlos Henrique Coelho Santos, titular interino da 6ª Delegacia (Galés), que acompanha as investigações, disse que, a princípio, o inquérito foi instaurado como homicídio culposo (sem intenção de matar), mas pode sofrer alteração com base no laudo do Departamento do Polícia Técnica (DPT), previsto para sair dentro de dez dias, devendo apontar as causas do acidente.
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‘Arquibancada em ruínas’
Eduardo Rocha
A precária estrutura da cinqüentenária Fonte Nova finalmente atraiu a atenção das autoridades. Só o desastre parece capaz de mobilizar ou agilizar a tomada de decisões fundamentais para a segurança do torcedor. É consenso que o estado do estádio é fruto da falta de manutenção, mas não é só isso que preocupa os especialistas.
O arquiteto e urbanista Carl Von Hauenschild acredita que a questão se concentra no anel superior. “Se o estádio mantivesse a estrutura do projeto inicial de Diógenes Rebouças, datado de 1951, o problema seria minimizado em 70%”, analisa, com a autoridade de quem participou de uma vistoria de cinco horas, promovida pelo Sindicato da Arquitetura e Engenharia (Sinaenco).
O estudo publicado no dia 1º de novembro, fruto das observações, visava analisar apenas o estado de manutenção e a condição dos estádios brasileiros, com foco na lista de encargos da Fifa para a Copa do Mundo de 2014. Mas veio bem a calhar. A Fonte Nova foi avaliada como a pior praça de desportos dentre as 29 checadas em 17 capitais e a cidade de Santos. A corrosão da estrutura metálica que sustenta 6.500 metros cúbicos de concreto já era visível.
Observando as fotos do estádio no site do Sinaenco, uma chama a atenção. A legenda é sucinta: “arquibancada em ruínas”. E para a surpresa dos desavisados, a fotografia registra “mais ou menos o local que caiu no domingo”, garante Hauenschild. Ainda assim, a maior dificuldade parece estar mesmo na flexibilidade. “Claro que há o salitre e outros aspectos. A corrosão é um processo natural, mas o balanço da arquibancada superior complica a situação”, alerta.
O segundo anel foi construído 20 anos depois da inauguração do gigante de concreto, em 1971. Antônio Heliodório Sampaio, professor e ex-diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Ufba, foi um dos responsáveis pela obra, ao lado do próprio Diógenes Rebouças. O arquiteto não foi encontrado pela reportagem ontem, mas já havia falado ao Correio da Bahia no Correio Repórter do dia 24 dezembro do ano passado.
Questionado sobre o balanço, a resposta é direta. “Foi feita para isso (a Fonte Nova). A oscilação das arquibancadas é tão natural quanto necessária. Uma construção imóvel não suportaria tamanha vibração”. E essa trepidação demanda justamente manutenção para não se tornar perigosa. Desde a sua ampliação, o estádio não passou por nenhuma reforma estrutural.
Paliativos - Em 2003, ensaiou-se um reforço na estrutura de aço e a instalação de borrachas – responsáveis por garantir o balanço seguro –, mas as obras foram parciais. Apenas 1/3 das tais borrachas foram colocadas. “Nós estamos levantando isso”, garante o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea), Jonas Dantas.
O órgão quer saber se foram mesmo aplicados os produtos anticorrosão, instalados os amortecedores e reforçada a estrutura. “O nosso Bobô disse ontem (domingo), em rede nacional, que isso foi encomendado. Vamos levantar se isso foi feito pela contratada”, completou.
O presidente ainda não sabe o nome da empresa responsável, mas qualquer obra de engenharia precisa de autorização do Crea, segundo a Lei de Manutenção Predial, nº 5.907, de 23 de janeiro de 2001. O registro facilitará a procura. A promessa é de que o resultado deste levantamento saia em pouco mais de uma semana.

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