sábado, 21 de abril de 2007

Salvem a geral!

A geral do Maracanã será extinta e dará lugar a uma nova área com cadeiras

por Fernando Paiva, 21/04/2005, http://www.revistaparadoxo.com/materia.php?ido=2141

"Geral: eu fui!". Alguém precisa lançar esse adesivo. A partir desta semana, o Maracanã entrará em obras para se adequar às normas da Fifa e a geral será extinta, dando lugar a uma nova área com cadeiras. É uma prova de insensibilidade cultural por parte de políticos e dirigentes esportivos.

Eu fui de geral em apenas dois jogos na minha vida, ambos históricos. O primeiro, durante a campanha do Fluminense na terceira divisão, foi o único em cinqüenta anos de Maracanã em que só a geral esteve aberta. O segundo foi no domingo passado, o último com geral na história do estádio.

Nessa segunda experiência, decidi protestar, indignado com o fim desse verdadeiro patrimônio cultural do carioca. Seguindo o mais fiel estilo geraldino, pintei um cartaz em que se lia "O melhor do Maracanã é o geraldino". Levantava o dito cujo toda hora que alguma câmera apontava para a platéia. Resultado: eu e meu cartaz-protesto aparecemos na Rede Globo em cadeia nacional, no intervalo da partida. Como se não bastasse, fui entrevistado pela imprensa escrita!

– Por que o senhor escreveu isso?
– Porque acho um absurdo acabarem com a geral! Isso aqui faz parte do patrimônio cultural do carioca! A geral é um carnaval em cada jogo!
– É um espaço democrático onde as torcidas se misturam, né? (Jornalista botando sua tese na boca do entrevistado).
– É!
– Pra qual veículo é essa matéria?
– Carta Capital!

Não sei desde quando a Carta Capital faz matéria sobre futebol. Mas vou comprar a próxima edição para ler meu brilhante comentário de que a geral é um espaço democrático onde as torcidas se misturam.

Porém, é preciso ressaltar que nem tudo são flores para os geraldinos. Para começo de conversa, a visão do jogo é péssima na geral. Além das cabeças dos próprios torcedores, há obstáculos à beira do campo que atrapalham, como banco de reservas, fotógrafos, cinegrafistas etc.

Outra desvantagem: a proporção de ambulantes para torcedores é muito menor que na arquibancada. É difícil encontrar algo pra comer ou beber. E quando se encontra, mais uma decepção: na geral os produtos são outros, todos mais toscos. Não tem biscoito Globo ou Mate Leão. Pra comer são uns tira-gostos esquisitos feitos em algum fundo de quintal e embalados num plástico sem qualquer etiqueta, informação nutricional ou prazo de validade. Pra beber é guaraná Toby ou uma das dez cervejas que se esgotaram em dois segundos quando um ambulante apareceu com elas no meio da multidão sedenta, perto de onde eu estava.

Além disso, geraldino que é geraldino apanha da polícia. Comigo não foi diferente. Ao fim do jogo, com o Fluzão campeão, cogitei a idéia de invadir o campo. Eu e todos os outros milhares de torcedores da geral, claro. Não deu nem tempo de pensar em um plano: os policiais trataram logo de jogar gás pimenta nos geraldinos e botar todo mundo pra correr. Meus olhos e minha garganta pagaram o preço de ir de geral. Mas agora, pelo menos, tenho história para contar pros meus netos e posso colar o adesivo no carro. "Geral: eu fui!"

Nenhum comentário: