15 de março de 2009 | N° 15908
ARTIGOS
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O futebol está no centro da vida de cada um de nós e ocupa, hoje, o lugar que nossos ancestrais dedicavam à religião até o início do século 20. Ser de tal ou qual equipe, e dar a vida por ela, é uma questão de fé cuja origem não se indaga.
Por que alguém é gremista ou colorado? Não se sabe e a opção desportiva fica como um dom conferido pelo Espírito Santo! Na maioria dos casos, há uma espécie de transmissão hereditária e os filhos herdam os genes futebolísticos dos pais. Mas, e quando irmãos são fanáticos torcedores de equipes rivais, ou filhos e pais optam por clubes antagônicos?
Torcer por determinada equipe é a única opção indissolúvel na sociedade moderna. Mudamos de partido político e até de confissão religiosa, ou nos separamos no casamento. Jamais de equipe, porém. A não ser os próprios jogadores, mas eles não contam, pois apenas alugam a habilidade dos pés por milionárias somas, como heroicos soldados mercenários.
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Como toda questão de fé, a opção futebolística facilmente se transforma em cego fanatismo e chega à violência. Entre os jovens, o álcool e a droga exacerbam ainda mais os ânimos numa sociedade onde tudo tornou-se violento: da propaganda à música (esse tum-tum-tum sem melodia que chamam de “música”), tudo parece acompanhar o agressivo e poluidor trânsito urbano.
E domina o futebol. Os torcedores multiplicam o que veem em campo, onde empurrões, trancos e pontapés são “táticas” para ganhar o jogo.
Cenas brutais de violência e até de morte aparecem aos nossos olhos pela TV. Essa estúpida brutalidade, em que jovens se enfrentam só por terem camisas diferentes, levou o ministro dos Esportes a apresentar um plano para “coibir a violência nos estádios”.
O plano do ministro Orlando Silva, porém, é de absoluta tolice: instituir um cadastro geral de torcedores e só vender entradas nos estádios mediante a apresentação de identidade...
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A ideia é estapafúrdia, não busca as causas do horror e só burocratiza a violência.
O cadastro geral de torcedores exigirá criar um novo órgão, com milhares de funcionários públicos incumbidos da função inútil de classificar assistentes! A medida é de uma inutilidade total. Apresentada como ironia por algum palhaço num picadeiro de circo, geraria risos e aplausos. Mas vinda de um ministro e apresentada com seriedade, torna-se ridiculamente perigosa.
E desnuda a mentalidade que nos governa há dezenas de anos: a visão do Estado policial, em que cada cidadão dependa dos burocratas de plantão.
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Por que não pensar em resolver as causas da violência nos estádios? Convocar, por exemplo, os dirigentes das federações e clubes, além dos jornalistas desportivos, para dar início à reeducação dos torcedores. O desporto é competição de beleza e destreza, não guerra fanática.
A reeducação teria de começar pelas táticas de jogo, abolindo-se o jogo bruto e voltando à habilidade do antigo futebol dos tempos de Tesourinha e Adãozinho, no Internacional, ou de Clarel e o grande Lara, no Grêmio. Triunfar no resultado, seja como for, a coices e patadas, é uma deformação do futebol e foge ao espírito da competição em si.
Mas como resolver isso no eixo Rio-São Paulo, onde alguns clubes viraram antros de corrupção e o futebol é “um negócio”, como no caso do Corinthians e de outros? Não tenho a chave mágica para resolver o problema, mas o cadastro de controle do ministro Orlando Silva é perigosamente idiota ou tolo.
A não ser que façamos algo mais amplo: por exemplo, um cadastro geral dos corruptos em todas as esferas da administração pública, no âmbito federal, estadual e municipal. Mas isso levaria talvez um século, tantos são eles!
*JORNALISTA E ESCRITOR
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