sábado, 2 de outubro de 2010

Contra a elitização

FUTEBOL

http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/frontdorio/post.asp?cod_post=328748&ch=n

Marcos Alvito, grande pesquisador e eventual companheiro de peladas, é o autor deste texto. Vale a pena pensar no que ele escreve:

Em defesa de uma arte popular

O bom e velho João Saldanha já chamava o futebol de arte e cultura popular. Todos conhecem e têm experimentado na carne aquilo que os ingleses chamaram de "colonização do futebol pelo capital". A face mais perversa, todavia, ainda está em andamento: a transformação dos estádios de futebol em uma espécie de futebolplex, onde deixam de existir torcedores e passam a existir apenas consumidores. O Flamengo cobrou R$50 por uma arquibancada no jogo contra o Palmeiras. Agora, quando sofrer um gol, ao invés de "Silêncio na Favela", é mais apropriado os adversários gritarem "Silêncio na Vieira Souto".

O Maracanã vai ser reformado pela milésima vez com o nosso dinheiro. Para quê? Diminuir (ainda mais) a sua capacidade, descaracterizando um bem tombado pelo patrimônio cultural e transformando o templo do futebol em um campinho de soçaite. Há jogos começando às 22h no Engenhão, sem nenhum esquema especial de transporte. Futebol virou sobremesa de novela.

A Copa vem aí e os empreiteiros já estão fazendo a festa. O candidato a deputado mais votado no Rio (Romário) faz propaganda com a camisa da seleção. Os velhos dirigentes perpetuam-se nos clubes e federações. Até aí, não disse nada de novo. Mas e nós, torcedores, o que nós vamos fazer além de comprar pay-per-view? Temos que criar uma associação de defesa dos direitos do torcedor (o nome pode ser outro). Utópico? O pessoal do Funk criou a APAFUNK e sem nenhuma verba, não só reverteram a lei que proibia os bailes funk mas conseguiram aprovar outra lei que reconhece o funk como patrimônio cultural.

Temos que exigir respeito, mas não haverá conquistas sem organização e luta. Nesse jogo não adianta só ficar torcendo. Quem vai nessa?

um abraço de torcedor,

Marcos Alvito

P.S: Minha proposta concreta é criar a associação de defesa dos direitos do torcedor. Para isso, gostaria convocar uma reunião em um lugar e horário bem simbólicos: no Bar Dezoito, em frente ao Portão 18 do Maracanã, no outro domingo, 10 de outubro, às 17h.
http://respeitemofutebol.wordpress.com/

FGV detalha problemas em estádios e ajudará Governo a cadastrar torcedores

UOL, 03/09/2010 - 07h00

Gustavo Franceschini
Em São Paulo


A Fundação Getúlio Vargas (FGV) está preparando um estudo no qual detalha os problemas dos estádios brasileiros para o Ministério do Esporte. A análise, quando concluída, será usada para a instalação do sistema de cadastramento de torcedores, previsto no novo texto do Estatuto do Torcedor.

O estudo custará, segundo o blogueiro do UOL José Cruz, R$ 4 milhões. A universidade está visitando estádios das Séries A e B para avaliar as condições dos locais. O Ministério do Esporte terá de instalar uma estrutura adequada para o reconhecimento biométrico do público e precisará adaptar os estádios para as novidades.

O sistema prevê que o cadastramento siga as bases do Registro de Identificação Civil (RIC), documento que futuramente substituirá o Registro Geral (RG). Dessa forma, o torcedor pode ser identificado na porta do estádio pela sua impressão digital, banindo possíveis condenados por meio de consulta à ficha online.

A FGV estuda, inclusive, a implantação do sistema biométrico facial, que é usado em cassinos, por exemplos. Com ele, o torcedor poderá ser reconhecido por câmeras especiais que captam, na porta do estádio, a fisionomia dos fãs.

Esse processo já havia sido apresentado ao Ministério do Esporte por empresas particulares e chegou à FGV na semana passada. Durante uma simulação de combate ao terrorismo feita pela Polícia Militar no Pacaembu, a israelense E-Sight mostrou o equipamento à imprensa e a dois engenheiros da universidade que estavam presentes.

“O problema desse sistema é que temos de testar se ele é rápido o suficiente. Teremos uma multidão nas catracas, e temos de ver se é possível fazer o reconhecimento rapidamente”, disse Alcino Reis Rocha, assessor especial de futebol do Ministério do Esporte.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Polícia detém 249 torcedores em Paris

Organizadas reagem a plano de segurança

Folha de São Paulo, segunda-feira, 09 de agosto de 2010
DE SÃO PAULO

Um protesto de torcidas organizadas realizado antes do jogo entre Saint-Étienne e Paris Saint-Germain resultou em um número de detenções sem precedente na história do futebol francês -e em um novo capítulo de sua crise.
No total, a polícia deteve 249 pessoas anteontem nas imediações do estádio Parc des Princes, em Paris. A quantidade surpreende, uma vez que, durante a última temporada inteira do campeonato, 152 foram detidos.
Quase todos os torcedores foram liberados, restando apenas nove presos.
Curiosamente, o protesto foi motivado por um novo plano de segurança desenvolvido pelo PSG para conter os conflitos entre as torcidas organizadas Auteuil e Bologne, que há anos protagonizam cenas de violência.
O plano prevê a venda aleatória de ingressos aos torcedores -de modo que se evite que membros de torcidas organizadas fiquem unidos na arquibancada.
Além disso, promove a distribuição de convites com tarifas adaptadas para torcedores "comuns", incentivando o retorno das famílias ao jogos no estádio. Os torcedores se queixam do plano, alegando uma tendência à "higienização" do Parc des Princes.
Ontem, o choque entre as torcidas e a polícia ocorreu após os membros das organizadas tentarem impedir a entrada de torcedores que tinham ingressos do jogo. "Fora do Parc des Princes, houve atos de violência, insultos e pressão sobre torcedores para impedir o acesso ao estádio", informou a Prefeitura de Paris ao "Le Monde".

sábado, 7 de agosto de 2010

Torcida solidária

Folha de São Paulo, quinta-feira, 05 de agosto de 2010

CRISTINA GRILLO

RIO DE JANEIRO - Existe no direito um conceito chamado responsabilidade solidária. Significa, em linhas gerais, que a responsabilidade sobre um ato cometido por membro de um grupo, empresa ou organização pode ser compartilhada por todos os seus componentes.
Líderes de torcidas organizadas pretendem entrar na Justiça para tirar de seus ombros essa responsabilidade, estabelecida nas recentes mudanças feitas no Estatuto de Defesa do Torcedor.
A partir de agora, de acordo com o estatuto, as torcidas organizadas respondem "de forma objetiva e solidária" por danos causados por seus membros em estádios, nas suas imediações e no trajeto de ida e volta para os jogos. Podem, por conta dos atos de torcedores, ser banidas das arquibancadas.
As organizadas argumentam que as penas devem ser aplicadas apenas aos indivíduos que desrespeitaram o estatuto.
Dizem que não têm como controlar os que entoam cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos.
Deveriam ter. Se conseguem organizar multidões, fretar ônibus que as levem aos jogos e criar musiquinhas que se espalham por todo o estádio, com um pouquinho de boa vontade convencerão seus componentes de que respeitar o estatuto será bom para todos.
Em entrevista à Folha, o presidente de uma das torcidas organizadas queixou-se: "Por acaso, quando um policial comete um crime, a polícia é fechada?"
Não, e nem o Estatuto do Torcedor prevê o fechamento das organizadas. Mas, quando um policial agride um torcedor, por exemplo, ele responde judicialmente por seu ato. Pode ser condenado e ir parar na cadeia.
Ao Estado, que empregou o policial, cabe indenizar a vítima em caso de violação da lei. Das torcidas organizadas, que cobram mensalidades de seus associados, espera-se compromisso semelhante.

"Para ser preso trabalhando, prefiro roubar"

Folha de São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2010

DE SÃO PAULO

A classe dos cambistas, a exemplo do que ocorre com as torcidas organizadas, mostra-se insatisfeita com o novo estatuto.
"Só queremos trabalhar! Apenas compramos os ingressos e revendemos por um preço um pouco maior. Mas é para facilitar a vida do torcedor", disse Roberto Buchecha, que atuou como flanelinha na partida entre São Paulo e Ceará com medo da intensificada fiscalização.
"Afinal de contas, se for pra ser preso trabalhando, prefiro assaltar ou roubar", finalizou Buchecha.
Apesar do receio do cambista-flanelinha, nenhuma ocorrência policial foi registrada na vitória do São Paulo no Morumbi, anteontem. Em Palmeiras 1 x 1 Corinthians, ontem, no Pacaembu, alguns cambistas foram detidos pela PM para averiguação.

No Rio, cambista se afasta do Maracanã

Foco da polícia muda de roletas para bares; quatro são presos, e um é condenado a pagar cestas básicas

Folha de São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2010

SÉRGIO RANGEL, DO RIO

O novo Estatuto do Torcedor empurrou os cambistas para os arredores do Maracanã. A maioria deles atuou ontem de forma mais discreta.
Eles deixaram as roletas do Maracanã, onde trabalhavam com tranquilidade, e se infiltraram em bares e restaurantes lotados da Tijuca e de Vila Isabel, bairros vizinhos.
De acordo com a nova redação do estatuto, cambista flagrado vendendo ingresso estará sujeito a prisão (de um a dois anos) e multa.
""Temos que dar o nosso jeito. O problema é que não tenho outra atividade. Sei que a pena é maior, mas não tive escolha", disse um cambista, detido por dois policiais militares do serviço reservado ao negociar ingressos com torcedores próximo a um bar, que fica a menos de um quilômetro do estádio.
Esse cambista atuava em dupla. Ele negociava os ingressos, que ficavam com o companheiro dentro do bar. Até o início do clássico, dois cambistas haviam sido presos perto ou dentro de bares.
No jogo de sábado no Maracanã, Fluminense x Atlético-PR, apenas o cambista Dario Vieira de Paula foi preso. No Jecrim (Juizado Especial Criminal), a pena de Paula foi convertida em pagamento de cestas básicas. Penas até dois anos podem ser convertidas em multa.
O estatuto é mais severo com quem fornece, desvia ou facilita a distribuição de ingressos para venda fora da bilheteria (ou nos locais autorizados pelo clube): a punição prevista é de dois a quatro anos de prisão e multa.
As mudanças no Estatuto do Torcedor, segundo o governo, servem para preparar o Brasil com antecedência para a Copa de 2014 e avançam em medidas punitivas.

VIOLÊNCIA
Diego Gomes, 21, torcedor do Flamengo, foi preso por incitar a violência. Ele soltou um morteiro na direção de torcedores do Vasco.
Longe do Maracanã, dois torcedores do Flamengo foram baleados em Realengo, bairro a quase 30 km do estádio. Eles estavam com mais de 30 torcedores quando ocupantes de um carro dispararam na direção deles.

Torcida se mexe contra lei mais dura

Organizadas, sem cumprir o novo estatuto, unem-se para modificá-lo

Folha de São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2010

GUSTAVO GROHMANN, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

No primeiro final de semana após a sanção do novo Estatuto do Torcedor, as torcidas organizadas estiveram mais do que nunca no centro das atenções da polícia.
Segundo as normas que passaram a valer na última quarta, além de estarem vetados os cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos, qualquer atitude de um torcedor afiliado a uma torcida organizada será de responsabilidade dessa entidade.
"Agora os atos não são mais individualizados, e está errado. Não se pode culpar a torcida e o presidente por todas as coisas que acontecem dentro ou fora dos estádios", afirmou André Azevedo, presidente da Dragões da Real, organizada do São Paulo.
"Tem que punir a pessoa que cometeu a arbitrariedade e não a corporação. Ou, por acaso, quando um policial comete um crime a polícia é fechada?", questionou.
É com esse pensamento que palmeirenses, corintianos, são-paulinos e santistas estão unidos para ingressar na Justiça e tentar modificar, ao menos em parte, a lei.
"Estamos nos organizando para lutar contra essa parte do Estatuto do Torcedor. Mancha, TUP, Gaviões, Independente, Dragões etc.", disse o vice-presidente da TUP (Torcida Uniformizada do Palmeiras), que pediu para ser identificado como Litrão.
"Vamos juntos atrás dos nossos direitos para acabar com essa história de responsabilizar toda a torcida pela atitude de uma única pessoa", acrescentou ele.
Mas, se por um lado as organizadas se unem em busca de seus direitos, por outro continuam se agredindo verbalmente nas arquibancadas, desrespeitando descaradamente uma das novas normas do Estatuto do Torcedor.
"Independentemente de mudanças, sempre orientamos os novos associados a não incitarem a violência. Mas é complicado ter um controle sobre isso também. Muitas vezes um torcedor comum puxa um grito e o estádio todo canta. Mas a responsabilidade vai acabar nas nossas costas", afirmou Azevedo, da Dragões da Real.
Mas nem tudo no novo estatuto foi reprovado pelas torcidas organizadas.
Tanto Azevedo quanto Litrão gostaram muito da conduta mais dura em relação aos cambistas. "Aí, sim, eles acertaram. Tenho certeza de que isso diminuirá muito a falta de ingressos", declarou o vice-presidente da TUP.

Justiça irá definir os limites do Estatuto do Torcedor

Governo federal vê situações que não estão bem definidas na nova lei e trabalha para que ela pegue até 2014

Folha de São Paulo, terça-feira, 03 de agosto de 2010

FILIPE COUTINHO DE BRASÍLIA

Qual a diferença entre xingar e discriminar? Até que ponto provocar a torcida rival é incitar a violência?
Todas essas situações, que podem resultar na expulsão do torcedor do estádio, ainda são uma incógnita até para o governo federal, autor do novo Estatuto do Torcedor.
Na avaliação do secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Felipe de Paula, a lei só sairá do papel se ocorrer uma "mudança de cultura" do torcedor.
Um dos responsáveis pelo texto da lei, ele diz que diversas situações não estão "muito definidas" e que o governo quer consolidar a lei até 2014.

Folha - Como o novo Estatuto do Torcedor vai funcionar?
Felipe de Paula - Quem vai responder é o Poder Judiciário, avaliando caso a caso. Qualquer lei passa por esse problema. Isso é definido no dia a dia, com eventual exagero ou subutilização da lei.

As interpretações sobre o que é xingamento ou discriminação ilegal não são subjetivas?
As dúvidas sobre até onde vai o limite da lei ocorrem com qualquer lei. Se a polícia pega alguém com droga e diz ser traficante, o Judiciário pode considerá-lo usuário.

Xingar a torcida adversária é incitar a violência?
Talvez não. Mas sabemos quando é discriminação. A linha não é bem definida, mas é fácil descobrir. A torcida do Palmeiras dizia "Mexeu com a Mancha Verde vai parar no cemitério", isso é incitar a violência. Mas, no calor do jogo, xingar poder ser piada.

Como o policial saberá que situação é incitar a violência ou apenas nervosismo do jogo?
O governo fará o treino até a Copa. Uma meta é identificar as situações que infringem a lei. Outra é evitar o que ocorreu em Brasília em 2008, quando um são-paulino foi morto com tiro na cabeça.

Como se definirá discriminação ou incentivo à violência?
Nenhuma medida visa diminuir a festa, mas dirigente de torcida organizada precisa saber que tem responsabilidades, e a lei torna isso claro. Teremos dificuldades. Como julgar aquele que tem camisa da organizada, mas não é associado? Esse é o caso a caso que a Justiça irá decidir.

Como o governo fará valer o novo Estatuto do Torcedor?
Vamos ter que ajustar a cultura do futebol. Evitar cânticos discriminatórios de xenofobia ou racismo passa pela mudança de cultura. Na prática, agora a polícia vai ter uma proteção legal para poder retirar esses torcedores.

Nova lei afasta três dos estádios

Com base no novo Estatuto do Torcedor, torcedores são condenados e ficarão longe dos jogos

Folha de São Paulo, terça-feira, 03 de agosto de 2010

SÉRGIO RANGEL, DO RIO

THIAGO BRAGA, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Dois cambistas foram denunciados e podem ser condenados a até dois anos de prisão, e um torcedor do Flamengo foi banido dos estádios pelo período de um ano.
Esse foi o saldo do primeiro clássico carioca (Flamengo 0 x 0 Vasco) depois da nova redação do Estatuto do Torcedor, que vigora desde a quarta-feira passada.
Em São Paulo, no primeiro confronto entre grandes rivais na cidade, três pessoas (dois torcedores palmeirenses e um cambista) foram autuadas com base na nova lei.
Foi em Palmeiras 1 x 1 Corinthians, no Pacaembu, também jogado anteontem.
Julgados, os torcedores ficarão afastados dos jogos do time até novembro, e o cambista foi condenado a prestar serviços à comunidade.
As mudanças na lei, diz o governo, servem para preparar o Brasil com antecedência para a Copa-2014 e avançam em medidas punitivas.
Integrante da Torcida Jovem do Flamengo, Diego Jorge Santos Gomes, 21, foi preso por soltar um rojão próximo à estação da Leopoldina, antes do jogo no Maracanã.
O local fica a menos de cinco quilômetros de distância do estádio, área que é coberta pelo novo estatuto. Ele estava acompanhado por cerca de cem membros da torcida.
No início da madrugada de ontem, foi julgado no Jecrim (Juizado Especial Criminal) e concordou com a pena de um ano longe dos estádios. Em dias de jogos do Flamengo, terá de se apresentar duas horas antes em uma delegacia perto de sua casa.
A lei proíbe torcedores de ""portar ou usar fogos de artifício ou quaisquer outros engenhos pirotécnicos ou produtores de efeitos análogos".
Dois cambistas foram denunciados no artigo do estatuto que prevê até dois anos de prisão. Cristiano dos Santos Pereira e Robson Soares de Paiva ganharam liberdade provisória e poderão ir a julgamento no Tribunal de Justiça do Rio. Um deles estava com dez ingressos. O outro, com cerca de 20 bilhetes.
A maioria dos casos registrados na delegacia que fica dentro do Maracanã foi com flanelinhas. Vinte e três foram detidos, mas o caso não é contemplado pelo estatuto.
Em Palmeiras 1 x 1 Corinthians, o Jecrim do Pacaembu teve três casos relacionados ao Estatuto do Torcedor.
Um palmeirense foi autuado por incitação a tumulto após ofender corintianos. O outro foi preso por tentar entrar no estádio com um rojão.
Eles foram julgados e proibidos de ver no estádio os jogos do Palmeiras até o dia 7 de novembro deste ano.
Além disso, terão de prestar serviços comunitários a uma instituição a ser escolhida. Chegarão à entidade duas horas antes do jogo e só poderão sair uma hora depois de terminada a partida.
O cambista, que teve de devolver o dinheiro do ingresso à vítima, prestará 84 horas de serviços à comunidade no período de 90 dias.
No RS, quatro torcedores do Inter brigaram entre si e terão de pagar R$ 100 cada um em cestas básicas para entidades assistenciais.
Ainda no Gre-Nal, um gremista disparou um rojão contra a torcida colorada. O suposto autor do fato não aceitou a proposta oferecida pela Promotoria para que ficasse três meses sem poder assistir aos jogos do Grêmio, e o processo ainda será julgado.
Em Minas Gerais, no clássico entre Atlético-MG e Cruzeiro, em Sete Lagoas (o Mineirão passa por reforma), não houve encaminhamentos ao Jecrim, informou a PM.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Rotulados

Folha de São Paulo, sábado, 31 de julho de 2010

Ministério da Justiça cria lista de estereótipos de torcedores em manual para aprimorar segurança

LUCAS FERRAZ
FILIPE COUTINHO
DE BRASÍLIA

Leigos, fanáticos, leais, especialistas e brincalhões. Furiosos, mártires ou excêntricos. Para o governo federal, torcedores podem ser tudo, menos normais e tranquilos.
O poder público bolou uma lista de estereótipos sobre quem frequenta os estádios para que as polícias entendam melhor o que se passa na cabeça dos torcedores.
Se você se considera leal ao time, esse sentimento, no texto, é traduzido como "parcialidade total e obsessiva". O time, no caso, "nunca atua mal, tem só dificuldades".
Os "fanáticos" são perigosos e carecem de atenção. "São a garantia de lucro nas vendas de ingressos e produtos licenciados", afirma o governo, antes de cravar: muitas vezes "são jovens e viciados em drogas, revoltados por natureza e sedentos por confusão. Podem ser diminuídos, mas não extintos".
A Folha teve acesso à versão "não revisada" do manual, feito pelo Ministério da Justiça para preparar as polícias para a Copa-14. Aliado ao Estatuto do Torcedor, tem como objetivo banir atos de vandalismo e garantir "uma cultura de paz" nos estádios. Para isso, dividiu os torcedores em oito categorias.
Se você é daqueles que sempre acham que o seu time vai perder, o governo o enquadra como um "mártir": nunca grita, "mas geme baixo para si próprio e abana a cabeça tristemente a qualquer movimento".
Todo brasileiro é técnico de futebol, reza o jargão, mas na cartilha esse é o "especialista", que "sabe mais do time que o próprio treinador".
Os "excêntricos" são indecifráveis: "vivem num mundo próprio, mas parecem necessitar da companhia da massa". Já o torcedor "brincalhão" tem "observações quase sempre grosseiras".
Se você é daqueles que "xinga o próprio time, a mãe do juiz ou os adversários", é classificado como "furioso".
Já o "leigo" é o torcedor que vai pouco ao estádio, pacato. Mas cuidado: "trazem problemas de pequeno vulto em grande quantidade, pois, pela irregularidade de comparecimento, desconhecem lei e costumes" de um jogo.

MINISTRO DO ESPORTE DEFENDE ORGANIZADAS

São Paulo, quarta-feira, 28 de julho de 2010



Orlando Silva Jr. declarou que as torcidas têm papel importante na valorização do futebol. "Sou daquele que acredita que torcida organizada é organização legítima de jovens do Brasil, que se reúnem para torcer por sua paixão." Ele minimizou os episódios de violência. "Em todo setor da sociedade pode ocorrer um ou outro desvio", disse.

Lei aperta o cerco contra manipulação e violência

Folha de São Paulo, quarta-feira, 28 de julho de 2010

Estatuto do Torcedor fica mais severo para organizadas, cartolas e juízes

SIMONE IGLESIAS
DE BRASÍLIA

Está com os dias contados a era da manipulação de resultados, dos cambistas, dos xingamentos preconceituosos e das torcidas organizadas que vão ao estádio apenas para tumultuar.
Esse cenário pode se tornar realidade se cumprida a lei sancionada ontem pelo presidente Lula, que aperfeiçoa o Estatuto do Torcedor e criminaliza essas condutas.
Sua fiscalização e seu cumprimento dependerão dos organizadores dos jogos, dos clubes, da denúncia de torcedores e da polícia.
As novas regras passam a valer hoje e terão que ser respeitadas nos jogos da Libertadores, do Campeonato Brasileiro e da Copa do Brasil.
As mudanças no Estatuto do Torcedor, segundo o governo, servem para preparar o Brasil com antecedência para a Copa de 2014 e avançam em medidas punitivas.
Manipulação de resultado (ou seja, o ato de um árbitro favorecer um dos times) e a compra de resultados por cartolas poderão ser punidos com prisão de dois a seis anos, mais multa.
Cambista flagrado vendendo ingressos estará sujeito à prisão (um a dois anos) e ao pagamento de multa.
Quem fornecer, desviar ou facilitar a distribuição de ingressos para venda fora da bilheteria (ou nos locais autorizados pelo clube) estará sujeito a reclusão de dois a quatro anos e multa.
Até mesmo o torcedor que desistir de ir ao jogo e tentar vender seu ingresso na porta do estádio poderá ser preso.
A lei é dura também quando trata das torcidas organizadas. Antes, se a polícia parasse um ônibus de torcedores e encontrasse dentro uma bomba caseira, por exemplo, o material seria recolhido e o grupo entraria no estádio.
A partir de agora, se forem encontrados instrumentos para prática de violência, os torcedores não mais poderão entrar nas arenas.
Torcedor que promover tumulto e incitar a violência em estádios por meio de ações, xingamentos ou músicas estará sujeito a prisão de um a dois anos mais multa.
Serão usadas câmeras de monitoramento por imagem (nos estádios com capacidade para mais de 10 mil pessoas) para flagrar esses atos.
Na sentença condenatória, o juiz poderá trocar a pena pela proibição do torcedor de assistir aos jogos em estádios por até três anos.

Lei mais rigorosa não inibe ação de cambistas em Porto Alegre

Folha de São Paulo, quinta-feira, 29 de julho de 2010

DA ENVIADA A PORTO ALEGRE

O endurecimento do Estatuto do Torcedor, em vigor desde ontem, ainda não foi sentido no Beira-Rio, palco da primeira semifinal da Libertadores, em Porto Alegre.
Nem o fato de o Internacional não ter colocado ingressos de papel à venda para a partida coibiu a ação de cambistas nas imediações do estádio, antes do confronto diante do São Paulo.
Torcedores, principalmente do time paulista, que estavam sem ingressos para a partida recorriam em grande parte aos vendedores ilegais para adquirir entradas no final da tarde de ontem.
De acordo com policiais que atuavam nos arredores do estádio do Internacional, cambistas foram detidos pela venda de ingressos falsos durante a tarde de ontem.
No entanto dois policiais consultados pela reportagem nem sequer sabiam que, com a nova lei sancionada anteontem pelo presidente Lula, que é mais punitiva, a simples comercialização de ingressos por cambistas já é passível de prisão.
Os cambistas que atuavam na porta do estádio Beira-Rio também ofereciam ingressos para a torcida da equipe mandante, ignorando o fato de o Internacional não ter realizado a venda de ingressos em suas bilheterias.
Toda a carga do time gaúcho foi direcionada aos sócios-torcedores, que utilizam um cartão magnético para acessar ao estádio. As entradas foram todas comercializadas na semana passada.

quinta-feira, 4 de março de 2010

Lei vai proibir palavrões, atos violentos e gestos obscenos em estádios da PB

04/03/2010 - 09h01


http://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas-noticias/2010/03/04/lei-vai-proibir-palavroes-atos-violentos-e-gestos-obscenos-em-estadios-da-pb.jhtm

Luiz Carlos Lima
Da Folhapress
Em João Pessoa (PB)

Protestos e músicas com palavras de baixo calão são os principais alvos da "Lei Pimenta na Boca"
Xingar o juiz, os bandeirinhas ou o perna-de-pau de um time de futebol está proibido nos estádios da Paraíba. Entrou em vigor nesta quarta-feira a "Lei Pimenta na Boca". Representantes de torcidas organizadas e o promotor Valberto Lira assinaram em João Pessoa um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) que cria essa limitação.

O regulamento proíbe palavrões, atos violentos e gestos obscenos. Não há punição prevista, por enquanto, aos infratores, mas dependendo da gravidade das ofensas o caso poderá parar numa delegacia.

A medida, que tenta pôr fim à violência nos estádios paraibanos, vale para o Estadual e para o Brasileiro da Série C, que tem o Campinense como representante do Estado.

O promotor disse que a medida começará como uma forma de conscientização dos torcedores. "Acreditamos que xingamentos e músicas com palavras de baixo calão incitam a violência", afirmou Lira. "O juiz agora está respaldado pelo TAC para prestar queixa em uma delegacia, por exemplo, caso se sinta ofendido pela torcida", disse Lira.

Policiais militares vão fiscalizar os estádios nos dias de jogo. As músicas com palavras de baixo calão serão as mais visadas nas blitze. Segundo o promotor, denúncias feitas por torcedores ou outras pessoas também serão apuradas.

"O ato obsceno por si só já é crime. Tudo o que ocorrer dentro dos estádios será investigado pelo Ministério Público e, dependendo da gravidade do caso, o infrator poderá até ser punido pelo crime de difamação", afirmou Lira.

Líderes das torcidas locais estão desconfiados. "Não tem como ficar nervoso e não falar um palavrão", disse o diretor da torcida jovem do Botafogo, Marcos Natanael Silva.

Para o presidente da torcida Botapaz, Denay Júnior, a medida não será rigorosa. "Já pensou pegar uma reclusão porque xingou a mãe do juiz?"

Após a assinatura do TAC, as torcidas terão três meses para cadastrar eletronicamente todos os seus membros e encaminhar o cadastro ao clube a que pertencem, à FPF, à Polícia Militar e ao Ministério Público.

Torcedor + trouxa = Trouxedor

16/02/2010


http://blogdotorero.blog.uol.com.br/arch2010-02-01_2010-02-28.html

(hoje, excepcionalmente, publico aqui o texto da Folha de S.Paulo)
“Torcedor”, segundo o dicionário Houaiss, significa “Aquele que torce nas competições esportivas”. Já “trouxa” quer dizer “Aquele que é facilmente iludido; tolo”.
Pois bem, creio que precisamos de uma nova palavra: “trouxedor”. Uma mistura de trouxa com torcedor. É isso que nós, aqueles que gostamos de ver uma partida de futebol ao vivo, somos.
Para começar, a ida ao estádio é um suplício. Se você vai de ônibus, fica com inveja das sardinhas. Se vai de carro, tem que deixar algum dinheiro com o flanelinha, o primeiro de vários malandros que você encontrará em seu caminho até o campo. Este personagem não passa de um chantagista. O dinheiro que você lhe paga não é para que ele cuide do seu carro, mas para que não o risque.
Neste domingo fui comprar ingresso no estádio do Pacaembu várias horas antes do jogo, e eles já estavam lá. Para quem não sabe, o Pacaembu tem zona azul, mas mesmo assim havia muitos deles.
Pois bem, depois de você deixar um cartão de zona azul no seu carro e de também pagar o flanelinha, você vai para a fila. Uma grande fila. Os responsáveis sabem que o número de compradores será enorme, mas nem se pensa em colocar mais gente trabalhando, o que pode não ser apenas incompetência, mas conivência com um esquema de corrupção que explicarei logo abaixo.
Depois de esperar quarenta minutos na fila, vi um torcedor sair do guichê dizendo em voz alta: "Cuidado aí, pessoal, eles estão vendendo ingresso de estudante a preço de inteira!"
Logo depois, um fiscal se aproxima da fila e esclarece: "Para o tobogã só há meia entrada. Mas tudo bem, todos poderão comprá-la e só pagarão metade do preço."
Porém, quando chego ao guichê, o bilheteiro, um sujeito usando uma camisa do Santos, diz que a entrada custaria trinta reais. Eu protesto e repito o que o fiscal havia dito. O bilheteiro resmunga e, milagrosamente, a entrada volta a custar R$ 15,00.
É claro que, se você preferir não enfrentar a fila, pode recorrer aos cambistas. Pagará uma “tarifa de conforto” e depois basta torcer para que o bilhete não seja falso. Em resumo, na hora da compra do seu ingresso, você pode escolher o pilantra para o qual vai deixar seu dinheiro.
E é um bom dinheiro, caro trouxedor. O ingresso mais barato custava R$ 30. Se você quiser um lugar melhor, o preço vai para R$ 50 ou R$ 60, mais que o ingresso de cinema mais caro da cidade, o do shopping Cidade Jardim (R$ 46).
Então, depois de pegar uma longa fila para entrar no estádio, você sentará sob o sol, no cimento, e será vítima de outro malandro: o ambulante. Neste caso, nem sei qual é pior, se o clandestino ou o oficial. Este vende seus produtos a preços inacreditáveis (um picolé custa R$ 4,00). Os do clandestino são mais baratos, mas não venha reclamar da qualidade.
Não, você não tem saída, trouxedor. Pois, se não quiser mais ir ao estádio, vai acabar no pay-per-view, que tem preços absurdos.
Ou, pensando melhor, há uma saída. É jamais comprar de cambistas, é fotografar bilheteiros pilantras e colocá-los na internet, é levar seu próprio alimento, é reclamar e dedurar os pilantras.
O torcedor desorganizado tem que se organizar de alguma forma. Senão será para sempre um trouxedor.

Por Torero às 10h36

terça-feira, 2 de março de 2010

Torcidas-empresas

Folha de São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 2010

Organizadas se converteram em lugares de negócios, valendo-se do marketing e do merchandising para competir com o material dos clubes

BERNARDO BUARQUE DE HOLLANDA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em caravana de apoio ao clube que contagiou o país no final dos anos 1970, o Corinthians Paulista, no seu drama de perseguição por um título depois de quase duas décadas de jejum, os Gaviões da Fiel distribuíam um folheto aos viajantes. O lembrete aos corintianos prescrevia: "Não corra, não mate e não morra".
O prospecto foi na época guardado pelo sociólogo Sérgio Miceli e consta da abertura de um dos primeiros artigos acadêmicos sobre o fenômeno das torcidas organizadas no Brasil. Em 1978, o texto foi publicado pela "Revista de Administração de Empresas", da Fundação Getúlio Vargas (RJ). Passadas mais de três décadas de sua publicação, o lembrete ainda ecoa como advertência, mas muito pouco de sua prudente recomendação parece ser hoje aplicável a determinados setores de torcidas organizadas.
Correr, matar e morrer tornaram-se verbos até certo ponto corriqueiros, atrativas palavras de ordem entre alguns adeptos dessas associações, como se pode observar nos incidentes fatais do último fim de semana, envolvendo torcedores de Palmeiras e São Paulo. As rodovias, as ferrovias ou quaisquer outros meios de acesso aos estádios são agora os locais privilegiados para o enfrentamento desses grupos.
Houve, de fato, uma mudança na dinâmica espacial dos confrontos entre torcidas organizadas. Se, até o final dos anos 80, as torcidas se confrontavam com mais frequência dentro dos estádios, a partir do decênio seguinte, a crescente vigilância em seu interior levou à sistematização das brigas para fora das arenas.
Desde então, a cada ano, o raio de ação da polícia nas imediações do estádio tem se alargado, criando uma espécie de segundo território de conflito. Este se afigura muito mais amplo e menos controlável em relação ao primeiro, o que coloca as forças da ordem diante de uma nova série de desafios a enfrentar.

Agonia
Conforme muitos estudiosos já assinalaram, a violência -bem como a busca por sua sublimação- é um componente agonístico liminar, constitutivo da sociedade e da atividade esportiva. Como tal, essa tensão, quer latente quer manifesta, está presente em um esporte popular como o futebol. No que diz respeito às torcidas organizadas, a especificidade de seus embates físicos é que ela assiste a ciclos violentos, verdadeiras "espirais" que fazem e desfazem vendetas ao sabor das gerações e das lideranças à frente dos grupos, com o efeito alarmante de difundir aquilo que na Europa se chamou de "pânico moral".
A cada nova tragédia, a sociedade é instada a se mobilizar e a expiar os seus "bodes". Quase sempre, a pedra de toque para a solução do problema recai na interdição das torcidas, por meio da simples extinção jurídica ou da proscrição dos "baderneiros".
Como se isso fosse apenas uma questão de norma -e não, principalmente, de costume-, os decretos vêm redundando em sucessivos fracassos.
Por que a situação é tão difícil de ser solucionada? Em parte, porque a aparente barbárie que evoca o comportamento violento das torcidas constitui apenas sua franja superficial.
Quando se discute o problema, pouco se atenta para o fato de que as torcidas organizadas não estão apenas na contramão dos princípios desportivos ou nos antípodas do futebol mercantilizado moderno. De forma homóloga à lógica dos clubes-empresas, as agremiações de torcedores se tornaram elas próprias torcidas-empresas. Orbitam em torno dos clubes -razão de existirem-, mas são também autônomas, com sedes, símbolos, legendas, cânticos e logotipos que traduzem uma identidade à parte.
Seguindo o etos comercial, as torcidas organizadas converteram-se em lugares de negócios, passando a se valer do marketing, do merchandising e da oferta de uma série de produtos ligados a suas grifes. Elas competem, assim, com o material dos clubes e atendem à demanda de seu público consumidor, adolescentes e jovens seduzidos pelo pertencimento a uma coletividade.
A expansão em âmbito nacional das torcidas acarreta ainda o recrutamento de mais simpatizantes, o que leva ao seu alargamento simbólico-territorial, à semiprofissionalização de seus quadros e à formação de uma complexa rede de relações sociais.
Nos primórdios do futebol, dizia-se que a prática esportiva era uma atividade intrinsecamente amadora, razão pela qual o jogador não podia ganhar dinheiro com o jogo.
No Brasil, foi preciso esperar até os anos 1930 para que tal formulação fosse refeita, com a adoção do profissionalismo no futebol e com a transformação do jogador em atleta profissional, capaz de auferir astronômicos salários. Talvez hoje nós estejamos, em meio à globalização do futebol, onde tudo se comercializa e se rentabiliza, assistindo a um debate moral não muito distinto.
Se o torcedor representa a quintessência da paixão futebolística, último bastião de um idealizado "amadorismo", até que ponto estaríamos dispostos a aceitar o fato de que o torcedor organizado pode fazer de sua atividade uma profissão legítima e legalizada?

BERNARDO BUARQUE DE HOLLANDA é pesquisador do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (RJ).

Os sem-política

Folha de São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 2010

Transformado em peça na máquina de consumo compulsivo, torcedor é vítima maior da despolitização que atinge a sociedade

LUIZ HENRIQUE DE TOLEDO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Assistência" foi um termo muito comum propagado pela imprensa esportiva até os anos 1930, condenando à passividade os torcedores mais populares. Estes se diferenciavam dos sócios, indivíduos notabilizados por laços mais estreitos, inclusive de parentesco, com os integrantes dos clubes.
A inauguração do estádio do Pacaembu, em São Paulo, e a transformação do futebol em evento de massa nos anos 40 redimensionaria os espetáculos futebolísticos e a importância dos torcedores.
Eles passaram a ser motivo de preocupação mais detida de parte dos poderes públicos, da imprensa e daqueles que organizavam os eventos, em virtude da intolerância e das rinhas que, diga-se de passagem, já existiam desde a época do amadorismo anterior aos anos 30. Os jornais não se cansavam de censurar as "desinteligências" frequentes promovidas pelo mau comportamento generalizado.

Faixas e cartazes
Foi nesse momento, então, que surgiram as primeiras organizações uniformizadas, indivíduos que acompanhavam as partidas em bloco, cantando, exibindo faixas e cartazes homenageando jogadores, cronistas esportivos e o próprio poder público.
Reciprocamente, a imprensa esportiva e os dirigentes dos clubes prestigiavam esses uniformizados por acreditarem que formavam um corpo elitizado (entenda-se "civilizado") no meio da massa.
Essa situação foi alterada com o aparecimento das torcidas organizadas, já no final dos anos 60.
Tratava-se de agrupamentos com nítida inspiração popular que se autonomizaram em relação aos interesses mais imediatos dos dirigentes e estabeleceram outros padrões para o ato de torcer.
Os ciclos de violência intensificados nos anos 90 e a ingerência cada vez maior da TV e dos canais pagos repercutiram na necessidade imposta por uma nova conduta torcedora.
Foi nessa conjuntura de políticas de repressão às organizadas que se inventaram os sócios-torcedores -analogia opaca que alude a uma espécie de acionista minoritário do clube- e o torcedor de poltrona, que paga para ver seu time pelo sistema pay-per-view, serviço oferecido pelos canais fechados (elitistas, não?).
Portanto, formas físicas ou simbólicas de violência não constituem um corpo necessariamente estranho dentro desse universo. Dirigentes que motivam os seus publicamente, ainda que de modo figurado, na lógica da contenda tendem cada vez mais a levar o espetáculo sacrificial para dentro da casa de cada torcedor plugado na web.
Há que saber administrar as formas da belicosidade que, de resto, é constitutiva do futebol. Assim como as organizadas não reproduzem toda a extensão do torcer, elas também não contêm todas as variáveis que explicam a violência tomada como linguagem de todos.
Ambientadas e nutridas nas dinâmicas de poder, as organizadas reproduzem os sucessos e fracassos das organizações sociais que conformam o que visualizamos por sociedade.
Nenhum destes aspectos lhes faltam: burocracia, hierarquias, lógicas de distinção, comprometimentos políticos com projetos coletivos próprios ou negociados com outros atores, discurso da parlamentarização das relações e, obviamente, violência instrumental nutrida por masculinidades hegemônicas, homofóbicas, e intolerâncias já esparramadas por toda a sociedade.

Vingança inconclusa
O problema não são as organizações em si. No geral, o comportamento belicoso e intolerante se manifesta de modo mais desgarrado, individualizante e descompromissado com qualquer projeto coletivo, descentralizando práticas e comportamentos que fogem em muito ao controle das elites torcedoras.
Como uma espécie de vingança inconclusa, as mortes se sucedem há décadas em nome de honras difusas em torno da adesão aos clubes. Elas certamente estão relacionadas ao desmonte da dimensão lúdica do jogo e ao esgarçamento da sociabilidade em uma sociedade armada.
Embora as imagens dos últimos acontecimentos mostrem hordas de torcedores se digladiando, não há guerra ali, não há cadeia mecânica de mando e obediência.
Essa é justamente a linguagem desgastada do poder que tem no fantasma da desordem unida a sua face oculta, mas companheira de todas as horas. Das instâncias policiais e judiciais espera-se apuração e indiciamento daqueles indivíduos que estiveram diretamente envolvidos nos confrontos generalizados.
Mas o que esperar daqueles que administram o futebol: os dirigentes de clubes, os políticos e as elites torcedoras? O cerne da questão parece residir na baixa qualidade das relações políticas travadas entre esses agentes. Não bastam reuniões administrativas para resolver a conduta torcedora neste ou naquele jogo em específico. A despolitização de longo prazo que se impinge aos torcedores só faz minar os investimentos coletivos em nome de outras violências instrumentais parciais, inclusive legais.
O desinvestimento orquestrado que se faz na cultura do torcer -transformada em mera coadjuvante da maquinaria do consumo compulsivo- também não colabora para o processo de cidadania esportiva, sobretudo às portas dos megaeventos que se avizinham por aí.

LUIZ HENRIQUE DE TOLEDO é antropólogo e professor na Universidade Federal de São Carlos (SP). É organizador de "Visão de Jogo - Antropologia das Práticas Esportivas" (Terceiro Nome).

A comunidade moral

Folha de São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 2010

Década de 60 marcou a ascensão das torcidas organizadas, que passaram de coadjuvantes a protagonistas do espetáculo ao adotarem a "metáfora da guerra"

Ricardo Nogueira - 28.jan.10/Folha Imagem

Torcedores são-paulinos durante partida em Barueri (SP)

JOSÉ PAULO FLORENZANO
ESPECIAL PARA A FOLHA

As torcidas organizadas, no Brasil, assim como os agrupamentos ultras, na Itália, começaram a ocupar as arquibancadas e a modificar o clima e a paisagem dos estádios a partir dos últimos anos da década de 1960. Lá, como cá, abandonaram a condição de simples espectadores da partida de futebol para desempenhar o papel de protagonistas do espetáculo que elas próprias criavam e desenvolviam, inspiradas pela "metáfora da guerra", como mostra a perspectiva antropológica de Alessandro Dal Lago.
A violência, no entanto, não se restringia aos limites de uma batalha simbólica, mas se deslocava no espaço, driblava as medidas de repressão e adquiria, ao longo do tempo, forma e intensidade, alcance e significados muito diversos. De fato, como mostram os estudos feitos na Itália, os jovens torcedores logo enveredaram pela estrada do antagonismo violento, militarizaram-se, adotaram a "lógica da guerra".
Isso os levava a planificar com antecedência a escolha do lugar da luta, a calcular o momento certo da ação, a delinear previamente a tática a ser empregada no combate travado cada vez mais fora das praças esportivas.
Ao mesmo tempo, procuraram alcançar um consenso em torno das "regras do jogo" no qual se achavam imersos -isto é, definir as armas, os atores e as circunstâncias do confronto. Uma circular redigida por integrantes do movimento buscava estabelecer os ditames do comportamento ultra: "Não se toca nas mulheres e nos velhos e não se enfrenta quem não tem nada a ver e não tem a possibilidade de se defender".
Visto por esse prisma, o estereótipo da "horda de bárbaros embriagados" transfigurava-se, segundo o sociólogo Antonio Roversi, em uma "comunidade moral". Esta era edificada com base em um repertório próprio de regras, dotado de mecanismos simbólicos de integração dos jovens reunidos na cultura da curva, na qual a violência desfrutava de um lugar privilegiado, mas não se revestia de uma forma caótica nem se desenvolvia de modo aleatório.
Ao contrário, ela se desenrolava no quadro das rivalidades e das alianças tecidas entre os diversos agrupamentos e de acordo com o código de comportamento aceito e partilhado pelos torcedores. A via brasileira apresentava pontos em comum com o percurso italiano, mas também se distinguia pela elaboração de características próprias e traços originais.
Nesse sentido, enquanto o caminho dos ultras atravessava o campo minado do extremismo político (alguns grupos se autodenominavam "brigadas", em alusão ao partido armado identificado pela estrela de cinco pontas), o das organizadas desembocava na República do Futebol, paisagem histórica definida por inúmeras experiências de autonomia -como, por exemplo, o Trem da Alegria, idealizado por Afonsinho, e a Democracia Corintiana, liderada por Sócrates.

Aspectos contraditórios
Essa paisagem histórica, delimitada pelos anos de 1978 a 1984, contemplava ainda a iniciativa do jogador Wladimir de estender às gerais e arquibancadas o processo de mudança deslanchado no Corinthians: "As discussões são abertas aos diretores, aos jogadores, aos sócios e até à torcida". Mas a participação desta última nos anos revolucionários do futebol brasileiro comportava aspectos contraditórios.
De um lado, ela promovia o salto de qualidade no exercício da violência, refletido tanto no conflito entre as organizadas do Santos e da Portuguesa -em 1979, na Taça São Paulo, com um saldo de 15 pessoas feridas- quanto nas brigas ocorridas antes, durante e após o clássico entre Santos e Corinthians, em 1983, com tiros disparados ao redor do estádio e focos de incêndio dentro do Morumbi.
De outro lado, ela reivindicava o direito de participação e o concretizava por meio de várias iniciativas. Entre elas, pode-se destacar, em 1977, o debate sobre a criação de uma Associação das Torcidas Organizadas; em 1978, a greve promovida pela Torcida Uniformizada do Palmeiras contra o desgoverno implantado no clube; em 1981, a crítica da Torcida Jovem do Santos à fórmula esdrúxula do Paulista; e, em 1984, a presença da Gaviões da Fiel nos comícios das Diretas-Já.
Violência e participação se constituem, portanto, nos fatores decisivos do universo das organizadas. Isso significa que, além do combate imprescindível e sem tréguas à impunidade dos atos brutais, o enfrentamento do problema atual pode incluir a criação de novos canais de participação e espaços de debate. De fato, como diz o sociólogo Antonio Roversi, juízos acusatórios e categoriais morais impedem a compreensão do quadro dinâmico das torcidas.
Eles não permitem, assim, elucidar as linhas de continuidade, identificar os pontos de ruptura, apontar as reviravoltas que ora as colocam no exercício de uma violência desregrada, ora as aproximam da prática democrática elaborada em conjunto por aqueles que desejam reinventar a República do Futebol e manter, tanto quanto possível, a rivalidade dos jovens torcedores nos limites de um duelo simbólico.

JOSÉ PAULO FLORENZANO é professor de antropologia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, bolsista da Fapesp e autor de "A Democracia Corinthiana" (Educ).

Novo Estatuto irá responsabilizar organizadas

Folha de São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 2010

DA REDAÇÃO

Durante encontro com o ministro dos Esportes, Orlando Silva Jr., na quarta-feira, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado, concordou em agilizar a tramitação de um projeto de lei que altera o Estatuto do Torcedor.
O texto define penas de reclusão para torcedores que praticarem atos de violência e responsabiliza civilmente as torcidas organizadas pelos danos causados por seus membros. O projeto, de autoria do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), está em fase de análise por comissões do Senado, que pode ser abreviada mediante acordo das lideranças.
A discussão foi reforçada após confrontos, no último domingo, entre torcedores de São Paulo e Palmeiras, que resultaram em um morto e pelo menos 20 feridos.

Barbárie e cidadania

JOSÉ GERALDO COUTO


Folha de São Paulo, sábado, 27 de fevereiro de 2010

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Não há soluções mágicas para a violência entre as torcidas, mas "civilizar" as organizadas pode ajudar
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TODA VEZ que os confrontos entre torcedores terminam em morte, como ocorreu nesta semana em São Paulo, proliferam as soluções salvadoras.
As mais frequentes são simplistas e inócuas, como a de permitir a entrada no estádio de só uma torcida, a do clube mandante da partida. Ideia antes de tudo burra, porque os combates não costumam ocorrer dentro dos estádios, mas em ruas, praças, estradas, estações de metrô. Com a restrição, prosseguiriam ocorrendo, talvez até mais acirrados.
Pelo mesmo motivo, teria pouco efeito prático a sugestão de fundo elitista (e veladamente racista) de elevar ainda mais o preço dos ingressos, com o intuito de "selecionar" os torcedores. Como se pobre fosse sinônimo de bandido, e da classe média para cima fôssemos todos civilizados.
Uma saída autoritária e igualmente inviável que sempre alguém propõe é a extinção pura e simples das torcidas ditas organizadas. Associações populares, com raízes e tentáculos nos bairros pobres de São Paulo, agremiações como a Gaviões da Fiel, a Mancha Alviverde e a Independente contam com dezenas de milhares de filiados e desenvolvem atividades que transcendem o âmbito do futebol.
Extingui-las sumariamente privaria milhares de jovens de ter, bem ou mal, um esboço de socialização, de sentimento de pertencer a uma coletividade e se identificar com ela, num país em que os laços de organização social são tão frouxos.
O que fazer então? Parto do princípio de que não há soluções mágicas. O Brasil não se civilizará da noite para o dia, não apagará por decreto os desajustes sociais, a ignorância, a cidadania precária. Temos um processo lento e penoso pela frente.
Mas algumas mudanças podem e devem ser implantadas o quanto antes. Por exemplo: é urgente que seja aprovada no Congresso a alteração do Estatuto do Torcedor que, entre outras coisas, responsabiliza civilmente as organizadas pelas ações de seus membros.
Isso é básico. Se um sujeito com uma camisa da Gaviões ou da Mancha agride ou mata alguém, deve ser preso, julgado e punido como qualquer criminoso. Mas, além disso, a entidade a que ele pertence, e em nome da qual diz estar "combatendo", tem que responder à Justiça.
Não é à toa que as organizadas têm feito pressão contra essa mudança na lei. Elas se habituaram, nos últimos anos, a uma situação paradoxal.
De um lado, são estigmatizadas por grande parte da mídia e da opinião pública quase como agremiações criminosas ou milícias paramilitares. Por outro, contam com uma série de privilégios concedidos pelos clubes (ingressos facilitados, ajuda com transporte, participação em reuniões de direção) e até pela PM, que escolta seus membros na entrada ao estádio em dias de jogo.
Hoje em dia é o torcedor comum, não vinculado a nenhuma organizada, que é discriminado, enfrentando dificuldades muito maiores para conseguir ingresso, acesso ao estádio e segurança.
Com mudança na lei e na atitude da Justiça e da polícia, as organizadas terão de se civilizar na marra, incorporando-se à sociedade e deixando de ser as aterrorizantes excrescências em que se transformaram.

Torcedores organizados chilenos trocam socos em praia do Rio de Janeiro

Folha de São Paulo, sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

Torcedores de duas das mais famosas "barra bravas" chilenas, torcidas organizadas, entraram em confronto na manhã de ontem, no Rio. Cerca de cem integrantes da Los Cruzados, da Universidad Católica, e da Garra Blanca, do Colo Colo, trocaram socos por quase cinco minutos nas areias da praia do Leme, na zona sul da cidade.
Nenhum torcedor chileno ficou gravemente ferido, mas o ônibus dos torcedores da Universidad Católica teve cinco janelas quebradas.
""Foi tudo muito rápido. Estávamos aproveitando o mar quando mais de cinco dezenas de torcedores do Colo Colo chegaram à calçada e destruíram o nosso ônibus", disse o gráfico José Vilanueva, 26, que suspeitava ter quebrado a mão, na 12ª Delegacia de Polícia, em Copacabana.
A confusão entre os torcedores surpreendeu a polícia do Rio por causa da distância percorrida pela torcida do Colo Colo. No dia anterior, o clube perdeu para o Cruzeiro (4 a 1), em Belo Horizonte. Já a Universidad Católica foi derrotada pelo Flamengo (2 a 0), no Rio. As partidas eram válidas pela Libertadores.
""Acontece de tudo em Copacabana, mas agora fiquei surpresa", disse a delegada Cristiana Miguel Bento.
Os torcedores do Colo Colo deixaram o Rio no início da tarde, depois de pagar cerca de R$ 5.000, prejuízo estimado sofrido pela organizada rival. Os seguidores da Universidad Católica sairiam da cidade na madrugada de hoje.

Lei que pune torcida ganha urgência

Folha de São Paulo, quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Novo Estatuto do Torcedor, que criminaliza atos violentos, está parado no Senado há quase dez meses

EDUARDO OHATA
MARIANA BASTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Após as brigas protagonizadas por torcedores de São Paulo e Palmeiras no último domingo, que culminaram na morte de um torcedor e em ao menos 20 feridos, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) pedirá urgência e proporá acordo de lideranças para agilizar a votação do projeto de lei que modifica o Estatuto do Torcedor.
Segundo o texto, o torcedor que promover tumulto ou incitar a violência no local do evento esportivo, no entorno ou nos trajetos de ida ou volta poderá ser condenado à prisão.
Jucá é um dos relatores da segunda de três comissões pelas quais teria de passar o projeto de lei, travado no Senado desde maio do ano passado, depois de ser aprovado na Câmara. No entanto, viabilizado um acordo de lideranças, essa obrigação deixará de existir.
A pauta do Senado está trancada por três medidas provisórias que tratam de assuntos diversos: gripe suína, crédito e concessões fiscais na área automotiva. Tão logo a pauta seja destrancada, Jucá pretende levar o projeto a plenário para que seja submetido à votação.
No final do ano passado, depois de Coritiba x Fluminense pelo Brasileiro, que foi seguido por uma batalha campal que deixou dezenas de feridos, Jucá havia proposto um acordo de lideranças pela votação imediata do projeto de lei. O parlamentar, entretanto, não foi bem-sucedido em seu intento.
O obstáculo que inviabilizava um acordo era um requerimento do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) para que um outro projeto de lei, de autoria do deputado Arlindo Chinaglia (PT- -SP), fosse integrado ao texto.
Em encontro com o ministro do Esporte, Orlando Silva Jr. e com o secretário de Futebol, Alcino Reis Rocha, na tarde de ontem, Dias foi demovido de manter o seu requerimento. E solicitou sua retirada.
Apesar do lobby das torcidas organizadas para a supressão do artigo 39-B, que as responsabiliza civilmente pelas ações de seus membros, ele foi mantido. ""O texto é o mesmo que veio da Câmara. Evitamos mudanças até para não provocar maiores atrasos", argumenta Jucá, em uma referência ao fato de que o projeto de lei retornaria à Câmara dos Deputados em caso de modificação de seu texto.
""Queremos aprovar essa lei rápido, para punir aqueles que agem mal. Trata-se do primeiro passo para essa violência entre torcedores deixar de acontecer", complementa o senador. ""Porém não é garantia de que não ocorrerão mais mortes."
O projeto de lei trata ainda de condutas que não estão previstas na legislação penal brasileira como crimes. É o caso da corrupção com o intuito de alterar ou falsear o resultado de uma competição, o que remete ao episódio da "máfia do apito", a ação de cambistas e também dos falsificadores de ingressos.

A banalização da morte

JUCA KFOURI


Folha de São Paulo, quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

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Mais um cadáver, outros 20 feridos, brigas de gangues espalhadas por aí e, na verdade, nada é novidade
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O OMBUDSMAN até andou reclamando em suas críticas internas, surpreso com a aparente naturalidade com que a editoria de Esporte tratava a questão da violência entre torcedores. Já o colunista criou uma palavra, ao inventar o trouxedor. Para azar nosso, tanto o colunista, José Roberto Torero, quanto o ombudsman, Carlos Eduardo Lins e Silva, despediram-se de suas funções nesta Folha.
O trouxedor desorganizado é mesmo um ser desamparado, e o jornalista que trata de esportes é alguém impotente diante da barbárie que cansou de denunciar sem nenhuma consequência.
Por mais que tenhamos a obrigação de persistir, de insistir, de não desistir, é o leitor, o ouvinte, o telespectador que nem quer mais saber desses episódios.
É como se todos estejam convencidos de que o Estado brasileiro é ausente e incompetente para cuidar da questão. Como foi e é para tratar da favelização, das enchentes, do saneamento básico, da educação, da saúde, questões postas há mais de 500 anos e muito mais bem resolvidas em países da nossa idade, como os Estados Unidos, ou mais jovens, como a Austrália.
Porque faltam inteligência, prevenção, repressão e punição para tratar da violência entre as gangues travestidas de torcedores de futebol, gente que se espalha pelos estádios, pelas adjacências deles, longe deles, bem longe deles, pelo país afora. Faces de uma mesma moeda realçadas em torno dos jogos de futebol, mas que, de fato, fazem parte do nosso dia a dia, nos assaltos nas esquinas, nos embates de traficantes de drogas entre si e contra a polícia e até nos trotes universitários.
As coisas chegaram a tal ponto que deixam mesmo de ser notícia, porque se tornaram banais.
Como se tornaram comuns as manifestações de estrelismo dos encarregados de tratar da questão pelo Ministério Público paulista, alguns se transformando em deputados, como Fernando Capez.
Outros, como o promotor de Justiça Paulo Castilho, confundindo alhos com bugalhos, a ponto de chamar Margareth Tatcher de rainha da Inglaterra na ESPN Brasil, e vítima do mesmo deslumbramento de seu antecessor.
Não bastasse, ainda convivemos com cartolas que frequentam as quadras dessas gangues e lá discursam com palavras hostis, como Luiz Gonzaga Belluzzo, presidente do Palmeiras, que cita Jean-Paul Sartre quando quer responder às bobagens de Vanderlei Luxemburgo, a quem já tratou como "gênio da raça" em entrevista ao jornal "Valor", mas grita "vamos matar os bâmbis!" na Mancha Alviverde.
Ou financiam seus desfiles carnavalescos, como Andres Sanchez, do Corinthians, com a Gaviões da Fiel, para redundar em selvagens agressões no sambódromo.
Tudo isso no país do presidente corintiano Lula; do governador paulista palmeirense José Serra; do governador carioca vascaíno Sérgio Cabral e do governador mineiro cruzeirense Aécio Neves, para não falar da governadora gaúcha gremista Yeda, cruzes!, todos tão impotentes como os jornalistas e tão entediados como os leitores.
Com a diferença de não cumprirem com as suas obrigações.

Suspeito de assassinar palmeirense vai preso

Empresário ligado à Independente nega ter matado torcedor em Jundiaí

Após relatos de outros três torcedores vinculados à torcida organizada do São Paulo, delegado diz que briga deve ter sido premeditada

MAURÍCIO SIMIONATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPINAS São Paulo, quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A Justiça decretou ontem a prisão temporária de um empresário de 29 anos suspeito de ter feito o disparo que matou o palmeirense Alex Furlan de Santana, 29, durante briga entre torcedores do Palmeiras e do São Paulo, no domingo à noite, nas margens da rodovia dos Bandeirantes, em Jundiaí.
Duas armas foram apreendidas na casa do suspeito E.M.V.J. e passarão por perícia para que seja verificado se o projétil que matou o palmeirense saiu de uma delas. Na briga, 12 pessoas ficaram feridas, entre elas um torcedor que amputou a mão direita, após uma bomba caseira ter explodido antes de ser arremessada. Estável, ele continua hospitalizado.
O suspeito, preso em São Carlos, foi transferido para Jundiaí e lá negou a autoria do assassinato, mas admitiu ter participado do confronto.
Segundo a polícia, o empresário preso é ligado à torcida Independente, do São Paulo, e foi ao jogo em uma van, ao lado de outros são-paulinos. Ele tem passagem policial por envolvimento em outras brigas.
O delegado responsável pelas investigações, Antonio Dota Júnior, preferiu não divulgar o nome do suspeito sob a alegação de que ainda não há a comprovação da autoria do crime.
Outros três torcedores ligados à Independente foram detidos em São Carlos e ouvidos pela polícia. Entre eles está um adolescente de 17 anos que confessou ter feito disparos na briga, mas negou ter baleado o torcedor. Ele foi encaminhado ao Núcleo de Atendimento Integrado de São Carlos, e os outros dois detidos foram liberados.
Segundo o delegado, os depoimentos indicam que a briga foi premeditada. Pela investigação, os torcedores ligados à Mancha Alviverde já aguardavam, nas margens da rodovia dos Bandeirantes, pela chegada do ônibus da Independente.
Cinco torcedores feridos, que estavam internados em Jundiaí, tiveram alta hospitalar na noite de anteontem. O corpo do torcedor morto, integrante da Mancha Alviverde, foi enterrado ontem em Limeira.

Mais um torcedor morre, e futebol se cerca de desculpas

Inoperância

Brigas entre são-paulinos e palmeirenses anteontem, em vários pontos de SP, deixam 1 óbito e ao menos 20 feridos

Autoridades repetem velhos discursos na tentativa de combater problema crônico de violência causado pelas torcidas uniformizadas

MARIANA BASTOS
SANDRO MACEDO
DA REPORTAGEM LOCAL São Paulo, terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

MAURÍCIO SIMIONATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPINAS

A história não é nova, mas o problema parece estar longe de uma solução: após um clássico no futebol paulista, mais uma pessoa morreu e ao menos 20 ficaram feridas, vítimas de confrontos entre torcedores de Palmeiras e São Paulo.
O incidente, na rodovia dos Bandeirantes, em Jundiaí, não foi isolado, mas se tornou o mais grave de anteontem. Choques entre as torcidas organizadas também foram registrados em bairros da capital e numa estação de trem em Santo André. Até a conclusão desta edição, ninguém foi preso.
A Polícia Civil investiga se a briga entre torcedores em Jundiaí (a 60 km da capital), que deixou ainda 12 feridos, foi premeditada ou "por acaso".
E o problema entre as torcidas organizadas extrapola o âmbito esportivo, como ocorreu durante a apuração do Carnaval paulista, quando membros da Gaviões da Fiel, indignados com as notas, chegaram a fechar parte da marginal Tietê. Para o desfile das campeãs, houve inclusive uma mudança na ordem de exibição das escolas para evitar conflitos entre a Mancha Verde e a Gaviões.
À sombra de mais uma morte proveniente de confronto de torcidas, Ministério Público, Polícia Militar e Ministério do Esporte repetem as soluções propostas depois de outros casos de violência envolvendo torcedores ocorridas em 2009.
Para o promotor Paulo Castilho, a Polícia Militar "fez um belo serviço de prevenção". "O que aconteceu ontem [anteontem] não foi falha da polícia."
O capitão Marcel Soffner, assessor de imprensa da Polícia Militar, concorda que foi feito tudo o que era possível. "Se não fosse a atuação da polícia, talvez o resultado fosse pior", diz.
Assim como em 2009, Castilho voltou a defender a torcida única para jogos de risco. "Em estádios como o do Palmeiras, o entorno é supercomplicado. Se não estivesse presente a torcida do São Paulo, os problemas não teriam ocorrido", diz. Para o promotor, as ações em diferentes pontos da cidade foram orquestradas pelas organizadas.
Em maio de 2009, mais de 150 pessoas foram detidas, entre palmeirenses e são-paulinos, perto da estação de trem Itaim Paulista. O bairro teve novamente choque entre as mesmas torcidas agora.
Ainda em 2009, após brigas entre são-paulinos e corintianos no Morumbi, o ministro do Esporte, Orlando Silva Jr., também defendeu a torcida única.
"No momento atual, talvez a melhor solução seja, em clássicos na capital, só o mandante ocupar as arquibancadas", disse ele em fevereiro passado.
Um ano depois, o "momento atual" parece o mesmo.
"O que o ministério pode fazer, está fazendo", afirma Alcino Reis Rocha, secretário nacional do Futebol da pasta.
Ele lembra que um projeto de lei, que muda o Estatuto do Torcedor e transforma em crime condutas violentas nos estádios e nos entornos, foi enviado ao Congresso em março de 2009. Após ter sido aprovado na Câmara, porém, o texto, continua no Senado, travado.
"Estamos fazendo solicitações para que seja aprovado e sancionado ainda no primeiro trimestre", declara Rocha.
Entre as mudanças no estatuto, está prevista punição para quem portar porretes e barras de ferro, num raio de 5 km do estádio ou num trajeto que seja identificado como de ida ou volta do torcedor (como no caso de anteontem, em Jundiaí).
Na nova lei, há penalidades que preveem a reclusão de seis meses a seis anos. Para réus primários, a prisão é substituída por banimento dos estádios.
No domingo, haverá um novo clássico, Santos x Corinthians, na Vila Belmiro. "Em princípio, a forma de atuação [da polícia] é a mesma. Episódios como esse servem de experiência e ajudarão nas discussões futuras", afirma Soffner, da PM.